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25 novembro 2006

Um "Apontamento" de João Cândido da Silva

No Público de hoje, na sua coluna habitual, João Cândido da Silva delicia-nos com mais um breve apontamento do qual reproduzimos alguns excertos.


Numa sociedade civilizada, o poder é utilizado para criar e aplicar soluções. Em Portugal, o poder serve para arranjar problemas. Porque este pode ser um bom negócio.
Quem age assim é mesquinho, promove a burocracia que grassa no sector público e nas empresas privadas mas que muito lhe convém, está-se nas tintas para os outros, sejam eles clientes ou utilizadores de serviços pagos pelos impostos, e não hesita em chantagear e contrariar, nem que seja por pura satisfação pessoal. Esta gente está em todo o lado. Nas corporações que se agarram aos seus privilégios e direitos adquiridos para travar a mudança. Nos sindicatos que preferem o imobilismo dos instalados à abertura que pode criar oportunidades para quem está fora do mercado de trabalho. Nos balcões dos serviços privados e nas repartições do Estado, onde os medíocres têm os seus momentos de glória quando sentem que do lado de lá está alguém em posição frágil e que pode ser beneficiado ou prejudicado através de uma pequena decisão. Estão no Governo, nas assessorias de imprensa, distribuindo informação e uma peculiar justiça de acordo com a avaliação que fazem sobre o bom ou mau comportamento dos órgãos de informação.
A esta praga que pode ser detectada em todo lado, por todo o país, pode chamar-se a síndrome do porteiro da discoteca. O homem que se planta à entrada do estabelecimento não é dono, não é investidor, não é credor. Mas é ele que manda. É ele que decide quem entra e terá direito a divertir-se e quem fica cá fora, deserdado do destino, apenas porque sim ou porque não. É neste ambiente que a corrupção alastra. Uma gorjeta choruda, discretamente passada para a mão do porteiro da discoteca, é o suficiente para mudar os seus humores. Um favor ou um frete também servem para ajudar a abrir portas. Há quem alinhe e há quem prefira tentar a sua sorte noutro lado, porque toda a prática instituída é repugnante. Mas aos porteiros da discoteca é difícil escapar. Tropeça-se neles no Estado central, nas autarquias, no sector privado. Poder, subserviência e corrupção. A trindade que guia a vida do porteiro da discoteca reúne aquilo que é essencial para explicar por que motivo Portugal é um país gravemente doente.

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