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31 março 2016

A mão esquerda...

... do poeta, mimada, preguiçosa, mais bonita.
Num poema a que 
Eugénio de Andrade 
intitulou
"Os trabalhos da mão"
.

Eugénio de Andrade
(visto por José Rodrigues - 1977)
.
Os trabalhos da mão
.
Começo a dar-me conta: a mão
que escreve os versos
envelheceu. Deixou de amar as areias
das dunas, as tardes de chuva
miúda, o orvalho matinal
dos cardos. Prefere agora as sílabas
da sua aflição.
Sempre trabalhou mais que sua irmã,
um pouco mimada, um pouco
preguiçosa, mais bonita.
A si coube sempre
a tarefa mais dura: semear, colher,
coser, esfregar. Mas também
acariciar, é certo. A exigência,
o rigor, acabaram por fatigá-la.
O fim não pode tardar: oxalá
tenha em conta a sua nobreza.
.
in "Ofício de paciência"
Fundação E.de A., 1994

30 março 2016

São quadras, meu bem... São quadras...

.
Baila em teu pulso delgado
Uma pulseira que herdaste...
Se amar alguém é pecado.
És santa, nunca pecaste.

29 março 2016

Humor antigo...

in. "Anedota Ilustrada", nº 41
Abril 1964
.
- É bem feito, para ver se perdes o costume de mexer em tudo...

28 março 2016

Pensamentos...

"Os vinhos são como os homens: com o tempo, os maus azedam e os bons apuram."
.
Cícero

27 março 2016

Provérbios...

"Quando não existem inimigos interiores, os inimigos exteriores não conseguem ferir você."
Provérbio africano

26 março 2016

O Liceu de Nun' Álvares...

... em Castelo Branco, em 1948/49
.
No 3.º Ano do Liceu já havia então 4 turmas.
Na primeira daquelas turmas estavam matriculados 30 alunas


1948/49   3.º Ano - Turma A

  1 Cassilda Augusta Martins Tavares
  2 Emília Robalo
  3 Fernanda Oliveira Mendes
  4 Ilda da Graça Antunes Pedro
  5 Irene de Jesus Oliveira Rodrigues
  6 Irene Silva Lopes
  7 Maria Benilde Antunes
  8 Maria Emília Esteves Lopes
  9 Maria Gil Silveira
10 Maria da Graça Pires Carreto
11 Maria Guilhermina Agostinho Azevedo Gamas
12 Maria Helena da Conceição Lobo
13 Maria Helena Martins Serrasqueiro
14 Maria Irene dos Reis Bravo
15 Maria Isabel Nunes de Sousa
16 Maria José Fazenda Coelho
17 Maria José Santos Teixeira
18 Maria de Lurdes Martins Beirão
19 Maria de Lurdes do Rosário Dias
20 Maria Natália Batista Andrade
21 Maria Noémia da Conceição Santos
22 Maria da Piedade Lencastre
23 Maria Regina Bidarra Gomes
24 Maria Rosa Ribeiro Ramos
25 Maria do Rosário Silva
26 Maria dos Santos Costa Lareia
27 Maria Susana Martins Vaz Oliveira
28 Maria Teresa Pequito Cravo
29 Rosa Pires Monteiro Correia
30 Soledade Cardoso Carmona
.
Para que conste.

25 março 2016

À consideração de Luís Correia...

... ilustre Presidente da Câmara de Castelo Branco.

 Dr.Luís Correia
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Ao ter conhecimento da nova Medalha da Cidade, da autoria dos escultores Isabel Carriço e Fernando Branco, tentei saber, a partir deles, onde poderia obter um exemplar (pelo menos um...) daquela sua excelente obra.  (1)
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Rapidamente obtive uma resposta que me entristeceu...
"João José Ainda bem que gostou, Bem-haja. Lamento dizer que não estão à venda. São para oferta da Câmara. Tentei dar a ideia ao Presidente de ceder umas com a numeração mais alta, mas não. Verdade seja que o João José bem merece, pelo que tem feito pela cidade. Hoje em dia quando se fala de Castelo Branco, fala-se da MEMÓRIA RECENTE E ANTIGA. Um beijo da amiga Maria Isabel Carriço."

Se a Câmara Municipal de Castelo Branco resolver colocar à venda alguns dos exemplares, que entendeu mandar fazer em número diminuto, tinha "todo o interesse "em adquirir "pelo menos um" desses exemplares.
.
À consideração da Câmara Municipal de Castelo Branco, na pessoa do seu presidente Luís Correia.
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(1)  "Parabéns pela Vossa obra!
Preciso de adquirir pelo menos uma medalha. É na CMCB que estão à venda? Quando digo pelo menos uma deveria dizer logo que costumo adquirir mais duas, uma para cada geração que "veio" atrás de mim: o meu filho e o meu neto, na linha de Castelo Branco."

Parabéns aos autores...

... pela nova homenagem que prestaram à nossa Cidade de Castelo Branco. Isabel Carriço e Fernando Branco merecem o aplauso de todos nós.

Isabel Carriço e Fernando Branco
.
Acabo de receber uma mensagem sobre a nova Medalha de Castelo Branco que me foi enviada pelos autores, a Isabel Carriço e Fernando Branco.
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Bons amigos
Aqui vai a medalha de CASTELO BRANCO
o nosso último trabalho e a moeda das Colchas.
Beijos e abraços Isabel e Fernando
.
Soube ontem, através de Reconquista, que “ O aniversário da cidade serviu de mote para o lançamento de nova medalha de Castelo Branco. Da autoria de Isabel Carriço e Fernando Branco, autores da primeira moeda produzida em Portugal com motivo de cor e que teve por base o bordado de Castelo Branco, a nova medalha é numerada e teve uma produção limitada e numerada de 100 unidades. A primeira ficará depositada no cofre da autarquia e a segunda e a terceira foram entregues aos ex-Presidentes da Câmara César Vila Franco e Joaquim Morão.
A medalha tem a particularidade de ter nomes de ilustres albicastrenses numa das faces, o bordado de Castelo Branco na outra e ao centro um módulo que gira dentro da medalha, tendo o brasão do concelho de um lado e a nova imagem gráfica da cidade no outro.”
.
Na mensagem que recebi esta manhã, Isabel Carriço apresentou alguns dados que pesaram na escolha das individualidades cujos nomes figuram nesta sua recente obra medalhística.
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A medalha:


O anverso e o reverso  da Medalha de Castelo Branco 
podem ser vistos de duas maneiras distintas
devido à mobilidade a placa circular central.
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E, num apontamento informativo, os autores dão-nos a conhecer algo mais sobre a Medalha agora dada a público:
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"Quando em 2015 aqui viemos, na qualidade de autores da Moeda Colchas de Castelo Branco, a primeira moeda com cor em Portugal, da série Etnografia Portuguesa, para o seu lançamento pela Imprensa Nacional Casa da Moeda, tivemos o gosto e a honra de ser convidados pelo Senhor Presidente da Câmara para criarmos uma Medalha que representasse Castelo Branco.

Representar Castelo Branco numa medalha não é fácil, sendo o seu percurso histórico e o seu presente indubitavelmente recheados de factos e entidades tão notáveis que é impossível caberem todos numa peça tão pequena."

Assim, tivemos em atenção e propusemo-nos incluir três elementos que, de certo modo a pretendem definir:

1 – Ao centro o seu Brasão – símbolo da sua identidade como Autarquia. Mas, este símbolo tanto se refere ao significado do conteúdo duma das faces da medalha, como da outra. É pertença de ambas as realidades. Por isso, resolvemos inclui-lo numa pequena peça centrada que, rodando em torno dum eixo vertical, vai marcar a sua presença no lado para que esteja virada.

2 – Numa das faces, um desenho do bordado das suas Colchas, seu Património, inspirado na barra de uma colcha existente no Museu Machado de Castro, em Coimbra.

3 – Na outra face, estão inscritas quinze Personalidades nascidas em Castelo Branco com excepção de D. Pedro Alvito e do seu primeiro Bispo que, de qualquer modo, deram o seu contributo a esta Cidade para sua História e de Portugal ultrapassando muitas vezes as suas fronteiras.

Escolher e seleccionar esse conjunto torna-se difícil e sempre incompleto; será sempre controversa a sua escolha mas tivemos o privilégio da ajuda de três investigadores que nos deram as hipóteses da selecção para incluirmos na medalha.

Queremos por isso, deixar aqui o nosso agradecimento ao Senhor Dr. José Martins, ao Senhor Arquitecto José Afonso e ao Senhor Dr. Alberto Tavares Barreto por essa indispensável contribuição.

Daremos assim o Nome e uma pequena resenha das personalidades aqui incluídas, com limite no início do século XIX:
  
1 – D. PEDRO ALVITO – (séc. XIII) 11º Mestre da Ordem do Templo e dos Três Reinos concedeu em 1213 a primeira Carta de Foral à povoação de Vila Franca da Cardosa, na qual é já designada por Castelo Branco.

2 – AFONSO DE PAIVA – (c.1443-c.1490) Incumbido por D. João II, para juntamente com Pêro da Covilhã, tentarem obter notícias no Oriente sobre as rotas comerciais para a Europa, da Índia e do mítico Preste João.

3 – JOÃO ROIZ DE CASTELO BRANCO, nasceu no século XV, Cavaleiro nobre, Fidalgo da Casa Real das Cortes de D. Manuel I e D. João III. Contador da Fazenda da Beira e Almoxarife da Guarda. Humanista, é mais conhecido pelos poemas incluídos no “Cancioneiro Geral” de Garcia de Resende, entre eles a sua cantiga “Partindo-se”

4 – João Rodrigues, mais conhecido por AMATO LUSITANO – (1511-1568) Cursou Medicina na Universidade de Salamanca. Exerceu clínica em Lisboa. Em 1534 partiu para Antuérpia onde permaneceu 7 anos. Foi depois para Ferrara e, em 1550, é chamado a Roma para tratar do Papa Júlio III. Fugindo de perseguições vai instalar-se em Ragusa (hoje Dubrovnik). Mais tarde fixa-se em Salónica onde morre e aí enterrado no cemitério judeu. Escreveu vários Tratados de Medicina e as 7 Centúrias.

5 – Frei BARTOLOMEU DA COSTA – (1553-1608) Doutorou-se em Teologia na Universidade de Coimbra. Em Lisboa ocupou o cargo de Tesoureiro-mor e Coadjutor da Sé, onde está sepultado. Muito ligado à Misericórdia de Castelo Branco foi homenageado com um monumento quando das Comemorações do V Centenário.

6 – FILIPE ELIAS DE MONTALTO – (1567-1616) Estudou Filosofia e Medicina em Salamanca. Casou em Castelo Branco mas resolve emigrar e segue para Livorno onde se estabelece como médico. Maria de Medicis convida-o para seu médico; ele aceita na condição de poder praticar a religião judaica. Em 1614 publica em Latim “Archipatologia” a sua obra mais importante e pioneira onde se estudam doenças mentais. Após a sua morte o seu corpo já embalsamado é levado para cemitério de Oudekerk da Comunidade Judaica, em Amsterdão.

7 – ANTÓNIO SOARES DE ALBERGARIA – (1581-1639 ou 1640?) Ordenado presbítero, sendo Beneficiado da Colegiada da Igreja de Santo Estêvão, em Lisboa. Notabilizou-se como heraldista, genealogista e pelas suas célebres obras “Tropheos Lusitanos” e “Livro de Armaria”.

8 – MIGUEL ACCIOLY DA FONSECA LEITÃO – (c.1609-c.1674) Estudou em Coimbra. Desembargador da Casa da Suplicação, Juiz dos Órfãos do Porto e Cavaleiro da Ordem de Cristo. Genealogista escreveu “Famílias de Castelo Branco”, “Famílias do Reino de Portugal” e “Árvore de Costados de Títulos de Portugal”. Sindicante Geral dos Estados do Brasil.

9 - PADRE ESTÊVÃO CABRAL – (1734 – 1811 ou 1812?) Nasceu em Tinalhas. Em Coimbra, ingressou na Companhia de Jesus em 1751. Foi, no Curso de Matemáticas que desenvolveu o seu entusiasmo pelo estudo da Hidráulica. Esteve em Itália e regressou a Portugal a pedido de D. Maria para estudar os leitos dos rios de Portugal.

10 – JOSÉ PESSOA TAVARES DE AMORIM – (1738-1815) Sargento-Mor da Companhia de Ordenanças de Castelo Branco; Vereador da Câmara, Cavaleiro Professo da Ordem de Cristo. Um dos homens mais ricos da Beira, como disse o Engº Manuel Castelo Branco, no tempo do Marquês de Pombal.

11 - D. Frei José de Jesus Maria Caetano - 1º Bispo da Cidade de Castelo Branco entre 1771 a 1782. Nomeado pelo Rei D.José e associado à elevação da vila a Cidade. Pôs cobro ao terror da Inquisição em Castelo Branco.

12 – MANUEL JOAQUIM HENRIQUES DE PAIVA – (1752-1829) Estudou Medicina, Filosofia e Farmácia. Doutor em Medicina, Lente de Química em Coimbra. Fidalgo e Médico da Casa Real. Faleceu no Brasil.

13 – JOSÉ ANTÓNIO MORÃO (1786-1864) Licenciatura em Medicina. Deputado por Castelo Branco e depois Governador do Distrito. Provedor da Misericórdia. Reitor do Liceu de Castelo Branco. Dramaturgo e Tradutor. Legou a sua vasta Biblioteca à Cidade de Castelo Branco.

14 – RAFAEL JOSÉ DA CUNHA (1791-1868) Grande proprietário, notável lavrador e criador do gado português. Com ele começou um longo processo para a construção do chamado Palácio dos Cunhas na Praça Velha, só acabada após a sua morte.

15 – MANUEL VAZ PRETO GERALDES (1828-1902) Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra e Deputado do Partido Constituinte. Teve grande influência na construção da linha de Caminhos de Ferro da Beira Baixa.
Director da Infância Desvalida de Castelo Branco, e intitulado Patrono da Beira Baixa.
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NB - Espero que uma tiragem tão curta não dificulte a aquisição de alguns exemplares.

Luciano fazia anos hoje...

Não!... Não foi por descuido. Nem foi por engano que este apontamento que aqui deixo acaba por sair com três semanas de atraso. Foi apenas por oportunidade... Aguardei a data do aniversário de Luciano Santos que ocorre hoje, para falarmos um pouco sobre aquela homenagem e sobre a obra do pintor.
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Por convite do António Quaresma Rosa assisti no passado dia 4 de Março, no Salão Nobre da Câmara Municipal de Setúbal a uma homenagem prestada a Luciano Santos, levada a feito pela Universidade Sénior de Setúbal - Uniseti com a colaboração do Centro de Estudos Bocageanos. A escolha do local não podia ter sido melhor... pois, como fundo, à figura dos oradores que por ali passaram, tivemos a possibilidade de repousar os olhos e admirar a obra magnífica com que o mestre Luciano revestiu a parede sul daquela preciosa sala de visitas da nossa cidade.  
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       Foi na sua reunião de 30 de Junho de 1952 que a Câmara Municipal de Setúbal, composta pelos srs. dr.Miguel Rodrigues Bastos (Presidente), Augusto César Lopes Pedrosa (Vice-Presidente) e Joaquim António de Carvalho e Oliveira, Dr.José Maria Cardoso Ferreira, Manuel Xavier Santos Jacob, Alberto Mendes, José Matias Narciso Ferreira de Freitas e Francisco Maria da Silva, vereadores, tomou a resolução, por proposta do seu Presidente, de confiar ao Pintor setubalense Luciano, a execução do Tríptico evocador de algumas das mais ilustres figuras de setubalenses de todos os tempos.

Sob a presidência de Sua Ex.ª o ministro da Educação Nacional, Senhor Professor 
Doutor Francisco Leite Pinto

foi o mesmo Tríptico inaugurado no dia 9 de Janeiro de 1957. aniversário do nascimento da grande Cantora Luísa de Aguiar Todi, sendo a Câmara Municipal de Setúbal constituída pelos sr.: Dr. Jorge Carlos Botelho Moniz (Presidente), Dr.Manuel Seabra Carqueijeiro (Vice-presidente) e Dr. Eduardo da Costa Albarran. Afonso Henriques Rocha, Dr.Joaquim Arco, Eng. António Barroso, Joaquim Rodrigues Simões e Dr. Henrique Chancerelle de Machete, vereadores.
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 Luciano Pereira dos Santos nasceu em Setúbal o dia 25 de Março de 1911
Tendo ficado órfão ainda criança, foi recolhido e acarinhado pela Câmara Municipal que o educou, primeiro no Orfanato Municipal e que, mais tarde, permitiu que estudasse e fizesse o Liceu; mais tarde ainda se encarregou o Governo Civil de o auxiliar com o pagamento da frequência e da formação artística que obteve com o Curso de Pintura.
Na verdade, a vocação que desde muito novo evidenciou para as Artes Plásticas levou a que o Governador civil de então decidisse enviá-lo, como seu bolseiro, para a Escola de Belas Artes em Lisboa, a fim de fazer o curso de Pintura. Como aluno deste estabelecimento de ensino foi-lhe concedida a "Pensão Ventura Terra" e conquistou depois o "Prémio José Malhoa", atribuído pela primeira vez, em 1934.

Luciano Santos (auto-retrato)

Segundo nos relata o seu filho, Luciano António dos Santos, "no final do Curso de Pintura, foi numa Missão Estética de Férias para Alcobaça, com os colegas de curso e foi ali que conheceu a minha Mãe, que o acompanhou e apoiou sempre ao longo de toda a sua vida"
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Na verdade, em 1940, recebeu em sessão pública e solene, das mãos do Chefe do Estado, Marechal Carmona, o “Prémio Nacional” da 3ªMissão Estética de Férias, atribuído pelo Ministério da Educação Nacional.

Exerceu o Ensino Técnico Profissional nas Escolas Industriais de João Vaz de Setúbal, Machado de Castro e Afonso Domingues de Lisboa..

Sobre Luciano, escreveu o Dr. Celestino Gomes:”A obra do pintor Luciano não precisa de explicação porque se explica a si própria: existe, colocada certa no tempo e no espaço.” Em finais da década de 50, dizia de Luciano o “brilhante crítico de arte Dr. Fernando Pamplona”: “Na figura, abalança-se ao retrato – e fá-lo com vigor e simplicidade que surpreendem. Não procura a elegância, sequer a graça, mas tão somente a nitidez e a fria análise. Obtém, por vezes, efeitos impressionantes, apesar da intencional dureza do modelado e dos contrastes.
(…) “Luciano soube descobrir e captar o carácter racial das mulheres da Nazaré, corajosas, rijas, afeitas às durezas da vida, às suas feras batalhas. Estão neste caso “Nazarena ”  (
Não sei a qual das "Nazarenas" se refere Fernando Pamplona, uma vez que existem duas peças com o mesmo nome... Tudo leve a crer que se trata da figura aqui representada sem cor.)
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A "Nazarena"
Óleo sobre cartão
Colecção particular

A "Nazarena" - 1946
Óleo
(Colecção particular o Exº Sr.Eng.Costa Alemão)
(Que pena não estar a cores)

No início desta sessão, realizada em 4 de Março, usou da palavra o António Quaresma Rosa que logo informou não ser possível ali estar presente o conferente convidado, sr.Luciano António Santos, filho do pintor, por motivos de saúde de alguma gravidade. Em seu lugar, encarregou-se de fazer algumas considerações com base num breve apontamento escrito por Luciano António, o Dr.Américo Pereira.

A intervenção do Dr.Américo Pereira

(numa foto de Simoes Silva)

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Outras obras de Luciano:

Praça de Bocage - 1952
Óleo sobre madeira
Museu de Setúbal - Convento de Jesus

Docas de Setúbal - 1970
Óleo sobre madeira
Colecção Particular
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No decorrer desta homenagem tiveram intervenções de muito mérito alguns dos convidados ali presentes.

A abrir a sessão, usou da palavra o Presidente da Direcção da Uniseti, Dr.Armando Sacramento que fez uma pequena introdução e agradeceu a presença de todos quantos ali estavam reunidos.
Falou em seguida o António Quaresma Rosa, colaborador do CIMM, um departamento da Uniseti, que se encarregou também de estabelecer e ordenar a participação de todos quantos quiseram contribuir para o brilho atingido na homenagem ao pintor Luciano. 

António Quaresma Rosa
(numa foto de Simoes Silva)
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1.Em nome do Centro de Estudos Bocageanos, Daniel Pires agradeceu à Uniset e a António Quaresma Rosa o convite para estar presente nesta homenagem a Luciano Santos.

Dr.Daniel Pires, 
do Centro de Estudos Bocageanos
(numa magnífica fotografia de António Claro)
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O Dr.Daniel Pires mencionou depois a ideia de preservar a memória de Setúbal quando em 2011 o CEB deu início à colecção “Clássicos de Setúbal”; aproveitou para mencionar o nome de algumas obras publicadas desde então, não esquecendo os autores das mesmas, nomeadamente Rogério Peres Claro e José Mateus Vilhena. Informou ainda que o Centro tinha decidido criar uma segunda colecção, a que deram o título “Clássicos de Setúbal de Bolso” que abre com a biografia de Luciano Santos, o pintor que ali se homenageava naquele momento.

2.Eng.Francisco de Paula Moniz Borba contou alguns episódios, um dos quais terminou com o pintor Luciano a almoçar em sua casa, a convite do Eng.João Borba, após uma intervenção do pintor na Capela do Corpo Santo. Recordações de infância mas que não esquecem.

A intervenção do Eng. Agr. Francisco Borba
(numa foto de Simoes Silva)
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3. António Santos fez uma intervenção a propósito da passagem de Luciano Santos pelo Orfanato Municipal de Setúbal, em paralelo com a experiência por que ele próprio passou uns anos mais tarde.
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António Santos aprendeu a ser tipógrafo
quando esteve no orfanato
(numa foto de Simoes Silva)
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No final, a Intervenção da poetiza Maria do Carmo Branco

Maria do Carmo Branco
recita Sebastião da Gama
(numa foto de Simoes Silva)

24 março 2016

Provérbios...

"Os ausentes estão sempre errados."
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Provérbio chinês.

23 março 2016

Eles foram meus alunos...

...em 1969/70
e frequentavam a turma C, da alínea f) do 6º ano (Ciências Naturais)
.
Esta foto foi tirada numa aula especial, em 1 de Abril de 1970, em jeito de despedida. No terceiro período que então começava, já tiveram um outro professor.

22 março 2016

São quadras, meu bem...São quadras...

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As meias pretas de seda
Que eu nunca antes te vira
Fazem-te as pernas bonitas...
E ficas muito mais gira!...

21 março 2016

Água da Lua...

... da autoria de 
George Jeunehomme,
antigo aluno do 
Liceu Nacional de Setúbal
.

George Gaston Albuquerque Jeunehomme
(1ºAno em 1954/55)
.
Uma edição de Dezembro de 1995

Com uma dedicatória bonita...

...e muita simpatia do autor.
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Não foi fácil escolher um dos seus poemas que aqui deixo. sem título...
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Abriu o bloco e escreveu;
eu,
(depois acendendo um cigarro, lentamente)
voltou a rabiscar;
amo-te,
(puxou uma fumaça)
já não escreveu mais,
rolando-lhe uma lágrima
nessa grande verdade.
Largou tudo
e deixou-se chorar.

20 março 2016

Uma tarde no "Central"...

...em Julho de 1972.
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Esta "Crónica" surgiu há dias à minha frente quando decidi "abater" muitas das coisas antigas que preenchem todos os cantinhos do meu escritório... Não tive a "coragem" necessária para enviar este "escrito" para o local onde seguiram tantas outras "recordações" daquela época...
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Não chegou a ser meu aluno tão somente porque resolveu seguir para a alínea e) de Economia, no 3.ºCiclo, enquanto eu, então, apenas me preocupava (e "lhes dava cabo da cabeça"...) com os alunos que seguiam para Ciências, na alínea f). Mas, apesar disso, tivemos alguns "contactos" curiosos que não podemos esquecer, passados mais de 45 anos.
A escrita do Zé de Matos passou a ter muitos leitores naquele jornal. Não sei se chamado pelo João Lúcio ou mesmo pelo próprio Director Guilherme Faria, o antigo aluno do nosso Liceu escreveu algumas crónicas cheias de interesse n' O Setubalense". Com 18 ou 19 anos e ideias que se inseriam num esquema de mudança que por aquela altura se vislumbrava, o José de Matos nunca deixou de ser um bom aluno que se interessava pelos problemas sociais que afligiam a sociedade setubalense. 
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É uma dessas crónicas que me atrevo a reproduzir hoje.
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José de Matos

Com um título destacado na 1ªPágina:


Uma tarde no “Central”…
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Falámos com um pedinte
Ficámos conhecendo um homem
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Pausa e conversa fiada com um grupo de amigos na esplanada do Central. Vocês sabem: Aquele aquário de “peixes humanos” que se agitam. Murmuram, gritam, batem palmas, calam o seu pensamento e, especialmente, põem a trabalhar ao ralenti  uma coisa que por cá nunca atinge grandes velocidades – a inteligência.
Uma tarde morna e a ameaçar a humidade da noite sadina. Um sol que já quase desaparece e um Bocage em cima de uma coluna onde não serão poucos os que gostariam de se empoleirarem para espreitarem por cima o que não são capazes de ver cá em baixo.
O ambiente usual em tardes de sábado. Tardes que adivinham a noite mais longa da semana…
Topámos um velhote com um ar tão patusco que é difícil descrever. Um andar mole, de botas cardadas à algarvio da serra. Uns olhos vivos e trocistas. Um velho guarda-chuva de pano azul, desbotado, enrolado (cuidadosamente enrolado) num saco de plástico.  Um saco remendado com borlas nas pontas. Aos quadrados. Uma manta ao ombro e um cajado nodoso na mão esquerda para ajudar o andar vacilante.
Umas mãos nervosas, sem calos, de unhas cortadas, que não diziam da vida deste homem que, por andar a pedir esmola é, socialmente chamado pedinte.  Sem tabuleta na testa. Pelo menos eu não a vi. Mas ela estaria lá , pelo ar de enfado que se desprendia de enfatuadas criaturas a cuja mesa ele tinha ido pedir uns tostões…
Chegou-se a nós mas nada disse. Pensou que tivéssemos visto a tal tabuleta que só vê quem a quer ver. Como em muitas outras coisas, afinal.
-- Boa tarde, dissemos-lhe
--“Bonsoir” – retorquiu ele, apressando-se a traduzir: Boa tarde.
Olhámos uns para os outros, pensando que era um caso de indivíduos que aprendem as frases necessárias para as alturas precisas.
--Dão-me dinheiro? Perguntou o velhote.
-- Só se pedir em francês – disse um de nós, entusiasmado pela primeira saída do idoso algarvio.
--“Pouvez-vous me donner quelque d’argent? – disse apressadamente, tornando a traduzir.
Começámos a achar piada pelo facto de ele saber “alinhavar” qualquer coisa de francês.
Perguntámos-lhe se sabia falar a língua gaulesa, e qual não foi o nosso espanto quando ele continuou a falar num francês bastante aceitável, traduzindo sempre, pensando talvez que não o compreendêssemos.
Conversa puxa conversa. Daí a pouco estávamos em diálogo ameno, com o velhote sentado à nossa mesa.
Contou-nos então que era de Faro, que tinha imigrado para França há muitos anos, que conhecia a Espanha, a França, a Itália, a Suíça, e, por aí fora, toda a Europa Central, até aos Países Baixos.
Falou-nos da implantação da República em Portugal, de alguns aspectos da acção do Dr. Afonso Costa (natural de Loulé, portanto  algarvio também) e, apesar de algumas incorrecções históricas, era de uma memória impressionante em relação aos factos que dominaram a vida política portuguesa durante a sua juventude.
Trabalhou em todos os países por onde andou. É capaz de se exprimir em espanhol, francês e italiano. Dava-se conta do atraso português em relação à Europa quando se referia às condições técnicas em que trabalhou e sobre as dominantes em Portugal, mostrou uma consciência  nítida do subdesenvolvimento mental (especialmente analfabetismo) em que as camadas populares foram mantidas durante muito tempo.
Falou-se da II Guerra Mundial e das condições deprimentes que ele detectou. Familiares seus morreram pouco depois de 45, na sua expressão, por causa “do frio e da fome” que passaram durante o flagelo que assolou a Europa.
E nós quase nos esquecemos de que estávamos no café…. Um homem em corpo e alma, com uma vida vivida e experimentada. Uma consciência adquirida no concreto, na vida, na sua relação com outros homens e outros povos. O seu contacto com outras línguas. O seu trabalho em terras da estranja e, as suas expressões, tão “patuscas” como o seu aspecto e tão profundas como as dificuldades em que perpassou a sua vida!
-- “Vocês! Vocês são ainda muito novos… Não sabem nada. O corrido vale mais que o lido, porque quem lê não viu. Quem viu foram os outros que escreveram. Quem corre conhece as coisas porque as vê”
E nós a pensarmos; e todos a julgarmos sempre que os livros são muito! Lá ser, são. Porém podem não ser nada. Podem der simplesmente “papel pintado”, em vez de vida.
A filosofia do mergulho na vida, como este homem  nos testemunhou.
-- “Qualquer dia morro. Uma pessoa sabe muito bem que tudo quanto nasce tem de morrer” – disse o velhote e acrescenta contristado: -- “Só tenho pena de morrer sem saber ao certo quem fez o céu e a terra e de não poder deixar aos portugueses a minha língua”. 
A sua “língua” que é a do conhecimento real das coisas, a da vida amassada na experiência difícil do existir todos os dias; a decisão de na altura da sua juventude ter tido coragem de passar a fronteira com a Espanha, com a Europa, fundamentalmente a do subdesenvolvimento e analfabetismo a que o acaso de ter nascido aqui o condenaria.
Não teria passado muito tempo. Talvez o tempo dos relógios, que por vezes se tornam as máquinas de estragar o coração das pessoas. Porém, o tom cordial da conversa, fizera-nos dar o salto. A simpatia da conversa tinha feito de nós amigos num diálogo, como se nos conhecêssemos há muito.
Digo-vos: passou pelo Central, faz hoje uma semana, um homem. Arriscava-se a passear incógnito, por ter a tal tabuleta que as pessoas põem na testa dos outros, quando não lhes interessa preocupar-se com eles.
Passou e gostava que o que ele nos disse não caísse em “saco de fundo roto”.
Passada uma semana, dou comigo a perguntar baixinho a mim mesmo:
“Onde terá dormido essa noite? Que terá comido? Quem lhe terá dito até amanhã e o acordou no dia seguinte?...

José de Matos

NB 1 - José Agostinho Martins de Matos tinha 19 anos quando escreveu este texto publicado em “O Setubalense”, no dia 22 de Julho de 1972
Actualmente é o Presidente da Comissão Executiva da Caixa Geral de Depósitos e foi Vice-Governador do Banco de Portugal

         NB 2 - Posso estar a cometer um erro grave... mas penso que actualmente há, pelas ruas da nossa cidade... (pelas ruas das nossas cidades...) bastantes mais "pedintes" sem "tabuletas" na testa...

19 março 2016

O triunfo dos porcos...

... e George Orwell.


George Orwell
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Eric Arthur Blair (George Orwell) nasceu na Índia em 1903. Autor de uma vasta obra literária que começa com Down and out in Paris and London (1933), escreveu dois livros fundamentais da moderna literatura Animal Farm (O triunfo dos porcos que é uma denúncia sarcástica do estalinismo) e 1984.
Combatente das Brigadas Internacionais na Guerra Civil de Espanha foi, acima de tudo, um homem que lutou contra o totalitarismo. Da sua obra disse George Orwell em Why I wright: "Todas as linhas de trabalho erudito que escrevi desde 1936 foram escritas, directa ou indirectamente, contra o totalitarismo e em defesa do socialismo  democrático, tal como eu o compreendo."
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Transcrevo aqui o início e o fim de uma obra que marcou fortemente uma época.
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Assim que as luzes do quarto se apagaram, produziu-se movimento e agitação em todos os estábulos e gaiolas da propriedade. Constara que o velho major, um porco branco que havia sido premiado, tivera um estranho sonho na noite anterior e que desejava transmiti-lo aos outros animais, Concordaram todos em reunir-se no celeiro grande logo que o sr. Jones se tivesse afastado.
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O velho Major, nome pelo qual era agora conhecido (quando o conduziram à exposição onde fora premiado levava o nome de Belo Willingdon), era tão considerado na propriedade que todos se dispuseram a perder uma hora de sono para ouvirem o que ele tinha a dizer.

Num dos cantos do celeiro, numa espécie de plataforma, Major já se encontrava recostado na sua cama de palha, por baixo de uma lanterna pendurada numa trave. Tinha 12 anos e ultimamente engordada muito, mas conservava ainda um porte majestoso, com inteligente e benévola aparência, apesar de nunca lhe terem sido cortados os colmilhos.
Dentro em pouco começaram a chegar os outros animais que se acomodaram confortavelmente e a seu modo. Primeiro chegaram os três cães, Bluebell, Jessie e Pincher, a seguir os porcos, que se sentaram na palha em frente da plataforma. As galinhas fizeram das janelas poleiros, os pombos voaram para os barrotes, os carneiros e as vacas deitaram-se atrás dos porcos e começaram a ruminar. Os dois cavalos, Boxer e Clover, entraram juntos, com passo vagaroso, assentando no chão com grande cuidado os pesados cascos, não estivesse debaixo da palha algum animal mais pequeno. Clover era uma gorda égua de meia idade que não voltara a recuperar a sua elegância depois depois de ter tido o quarto filho.
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Boxer era um grande animal: tinha 1,80 m de altura e mais força que dois cavalos juntos. Apresentava uma risca branca no focinho que lhe dava certa aparência de estúpido, e na verdade, não possuía uma inteligência de primeira classe, mas todos os outros animais o respeitavam pela firmeza de carácter e pela grande capacidade de trabalho.
Depois dos cavalos chegaram a cabra branca Muriel e o burro Benjamim.
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Benjamim era o mais velho dos animais da quinta e o de pior humor. Raras vezes falava e, quando o fazia, apenas se lhe ouviam observações cínicas. Por exemplo, dizia que Deus lhe havia dado rabo para enxotar as moscas, mas que preferia não ter rabo nem moscas. Sozinho entre os animais da quinta, nunca se ria. Se lhe perguntavam porquê, respondia que não via nada que lhe desse vontade de rir. Contudo, era muito dedicado a Boxer e os dois passavam geralmente o domingo juntos no pequeno prado que ficava por detrás do pomar, olhando um para o outro, mas sem falarem.
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Os dois cavalos tinham acabado de se deitar quando entrou piando debilmente uma ninhada de patinhos que haviam perdido a mãe e procuravam lugar para se recolherem. Clover, com a pata dianteira fez uma espécie de muro à roda da ninhada e os pintainhos aconchegaram-se  e dispuseram-se a dormir. Quase à hora de começar chegou Mollie, a tola e bonita égua branca que conduzia a charrete do sr.Jones, muito elegante e a mastigar um torrão de açúcar. Escolheu um lugar bem à frente e começou a sacudir a linda crina na esperança de atrair a atenção para os laços encarnados que a adornavam. Por fim veio o gato, que olhou à roda, à procura de lugar mais quente, e se anichou entre Clover e Boxer ronronando satisfeito durante toda a exposição do Major sem sequer dar a o trabalho de lhe prestar atenção.
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Todos os animais estavam presentes excepto Moses, o corvo domesticado, que dormia num poleiro atrás da porta das traseiras. Quando major viu que todos se tinham instalado confortavelmente, tossiu para limpar a garganta e começou:
-- Camaradas! Vocês já ouviram falar do estranho sonho que tive a noite passada. Mas trataremos do sonho depois. Tenho alguma coisa para vos dizer antes disso. Não creio, camaradas, que esteja muitas mais vezes, convosco. Devo morrer em breve e acho meu dever transmitir-vos os conhecimentos que adquiri. Tive uma vida longa e muito tempo para pensar quando estava só no meu curral e julgo poder dizer que compreendi o sentido da vida nesta terra, tão bem como qualquer animal vivo. E a propósito disso que vos vou falar.
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“Agora, camaradas, pergunto: -- qual é o sentido desta nossa vida? Temos de admiti-lo: a nossa vida é miserável, trabalhosa e curta. Nascemos, dão-nos a comida justamente necessária para nos mantermos. Enquanto podemos respirar somos forçados a trabalhar até ao final da nossa resistência e, quando esta acaba, somos assassinados com crueldade. Nenhum animal da Inglaterra conhece, depois de ter um ano de idade, o significado das palavras felicidade e descanso.
”Nenhum animal é livre em Inglaterra; a vida de um animal é a miséria e a escravidão. Esta é a verdade nua e crua.
“Mas será por esta terra ser pobre que não pode haver vida decente para aqueles que nela trabalham? Não, camaradas, mil vezes não.
“O solo da Inglaterra é fértil, o clima é bom e é capaz de fornecer comida com abundância a uma quantidade de animais muito maior do que a daqueles que agora habitam o país.
“Esta pequena quinta pode sustentar uma dúzia de cavalos, centenas de carneiros, vivendo todos com conforto e dignidade, que presentemente quase desconhecemos.
“Então porque vivemos nós nestas condições miseráveis? Porque a quase totalidade do produto do nosso trabalho é roubada pelos seres humanos. Esta é a resposta a todos os nossos problemas. Toda a nossa miséria se resume a uma só palavra – o homem. O homem é o único inimigo real que temos. Retirem o homem da cena e a causa da fome e do excesso de trabalho desaparecerá para sempre.

“O homem é  a única criatura que consome sem produzir. Não dá leite, não põe ovos, é muito fraco para puxar arado e não corre o bastante para caçar coelhos. Pois, apesar de tudo isto,  é o senhor de todos os animais. Manda-os trabalhar e do produto desse trabalho, dá-lhes só o mínimo necessário para não morrerem de fome. O nosso trabalho lavra a terra, o nosso estrume fertiliza-a e, no fim de tudo, apenas somos donos da nossa pele.
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"Todos os animais são iguais, mas alguns, 
são mais iguais do que outros"

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Todos aplaudiram entusiasticamente e as canecas foram esvaziadas. Mas quanto mais os animais lá fora olhavam, mais lhes parecia que alguma coisa e estranho se estava a passar. O que seria que se tinha alterado na cara dos porcos? Os olhos opacos de Clover iam de uns para os outros. Alguns tinham 5 queixos, alguns 4, outros 3. Mas o que seria que se estava desvanecendo e alterando? Terminados os aplausos, os convivas retomaram o jogo que fora interrompido e os animais retiraram-se silenciosamente.
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Poucos metros tinham andado quando o ruído de vozes os fez retroceder. Lá dentro decorria uma luta violenta. Estavam a gritar, a dar pancada na mesa, a trocar olhares desconfiados entre si, a proferir negações furiosas. A origem do problema parecia estar no facto de tanto Napoleão como o sr. Pilkington terem descartado, simultaneamente, o ás de espadas.
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Não havia dúvidas agora sobre o que estava acontecendo às caras dos porcos. Os que se encontravam lá fora olhavam do porco para o homem, do homem para o porco e novamente do porco para o homem, mas era já impossível distinguir uns dos outros."

Este livro foi escrito entre Novembro de 1943 e Fevereiro de 1944.