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15 abril 2007

A Drª Odete Santos

A blogosfera dedicou algum espaço à Drª Odete Santos que assinou ontem, pela última vez, o livro das presenças, na Assembleia da República, após 26 anos de uma actuação que eu considero honesta e de acordo com as suas ideias. Que não são as minhas... O que não impede que a considere uma boa e coerente deputada.

Odete Santos

Aqui ficam duas opiniões de entre as muitas que podem ser lidas no Público, de hoje:

Primeira:
Não sou comunista; é conhecida a minha posição sobre este partido: não é democrata! Não aprecio o estilo da Drª Odete Santos; tem uma postura que de quando em quando me irrita! Respeito a convicção com que luta pelas suas ideias; mas, quase sempre, as ideias que a Drª Odete Santos defende, são as que eu combato! Dito isto, vou ao essencial: admiro as pessoas que lutam abnegadamente por aquilo que genuinamente acreditam! E nesse sentido, reconheço que a Drª Odete Santos foi uma excepcional deputada! Mais do que tudo: irrita-me solenemente o hábito de vários partidos de substituírem os deputados que os portugueses elegeram, por estafermos que ninguém conhece, sem a menor competência (sim, chamei estafermos a alguns deputados!)Acho vergonhoso a Drª Odete Santos não terminar o seu mandato! Mas comoveu-me ter tido a possibilidade de sair com a dignidade que merece!
(http://ireflexões.blogspot.com)
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Segunda:

A deputada Odete Santos, do PC, despediu-se hoje do Parlamento, com um discurso emocionado… É talvez a última das verdadeiras comunistas, daquelas que não vacilam nas suas convicções, não abdicam do que acreditam nem “metem os ideias na gaveta”. (…) Nunca fez tanto sentido a frase dita de forma emocionada “Até amanhã Camaradas!” Ficou o Parlamento mais pobre, mas Odete Santos saiu da forma que quis, coerente consigo própria como não podia deixar de ser(http://atlanticoplantado.blogspot.com)


Como exemplos bastam...
O O O

A Drª Maria Odete Santos foi aluna do nosso Liceu. Uma óptima aluna, diga-se de passagem!
As médias com que terminou os vários anos que frequentou aqui no Liceu atingem os 15 valores!
Devo fazer uma breve mas firme advertência… Os 15 valores na década de 50… não têm comparação possível com os 15 valores que por aí abundam agora.

A sua primeira matrícula no 1ºAno foi em
Outubro de 1951.
E, sem falhar um só ano que fosse, lá lhe vamos seguindo o percurso até ao dia em que terminou o 5ºAno, em Julho de 1956, sempre mantendo aquela média e sempre classificada no Quadro de Honra de que ela, com certeza, e apesar das ideias que acumulou depois disso, deve sentir bastante orgulho.

Rostos e nomes conhecidos, lá os vamos encontrar como seus companheiras de turma, ou de ano. Como bem podemos imaginar só em raras excepções
encontramos naquela época turmas mistas…
Mas já as havia em muitos Liceus do país. E até no nosso!

A aluna Odete Santos esteve sempre em turmas femininas e no decorrer dos cinco anos podemos encontrar como suas colegas a Carlota Landeiro, (que era filha do Prof. Landeiro que ensinava no Montijo e fazia jornalismo no jornal lá de terra), a Fernanda Valido (professora de Biologia em Setúbal), a Catarina Perienes (que casou com o Eng. Franco e Silva, da Socel e vive há muitos anos em Aveiro), a Conceição Fialho (professora de Biologia em Setúbal), a Fátima Cabral Adão e a nossa colega professora de Física no Liceu, Helena Rodrigues (Marcelino). Faziam todas parte da Turma B, do 5ºAno.

No 5ºA, a turma dos rapazes, lá poderemos descortinar, como colegas de ano da Odete Santos, alguns alunos bem conhecidos:
o António Salgado Soares, o malogrado Carlos Maldonado Machado, o Francisco Canana, o Cândido Revez, o Orlando Valadas, o Eurico Garrido, o Valter Marcelino. o Carlos Clérigo.

Apenas como curiosidade, posso acrescentar que ambas as turmas tinham o mesmo Director de Ciclo, o Dr.Fernando Pinho de Almeida, mas enquanto o Secretário da turma masculina era o Prof. Cristóvão Silva, de Ed.Física , a feminina tinha como Secretária a Profª de Educação Moral, D.Maria Virgínia Fialho.

Julgo que teria sido no Colégio Frei Agostinho da Cruz, do Coronel Augusto de Carvalho, que ela fez o Curso Complementar dos Liceus que não tinha chegado ainda ao Liceu Setúbal. Ou então, se eu estiver equivocado, a Odete Santos ter-se-ia matriculado num dos Liceus de Lisboa onde terminavam o curso Complementar, a maioria dos alunos de Setúbal que queriam ter acesso a um Curso Superior: o Passos Manuel, ao fundo da Calçada do Combro ou o D. João de Castro, lá para o alto da Ajuda.

Quando vim para Setúbal em 1959, a aluna Odete Santos estudava em Lisboa, já na Faculdade de Direito (ainda no campo de Santana?...). Mas uns anos mais tarde regressou a casa dos Pais, no Bairro da Conceição, e tornou-se, em Setúbal, uma excelente advogada. E não estou a dizer isto com qualquer intuito obtuso! Ouvi, e recordo muito bem, as palavras do comum Amigo Dr.José Carlos Sequeira Lopes, um Monárquico com quem ela se dava às mil maravilhas, que “em qualquer acordo judicial que tivesse com a DrªOdete Santos, podia não ficar nada escrito e selado… Bastava-lhe a palavra da Odete!...
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Ao fim destes anos todos não tenho a certeza de quem teria sido o “patrono” que teve a Drª Odete Santos como estagiária. Por um lado, creio ter sido o José Carlos Sequeira Lopes… mas, por outro, atendendo à pouca diferença de idades que ambos teriam e ao facto de haver em Setúbal, por essa altura um “velho”, mas muito bom causídico que dava pelo nome de Dr.Manuel Antunes… talvez eu esteja enganado e a DrªOdete teria “aprendido” a sua profissão com este outro Setubalense ilustre… que morou muito tempo no prédio onde se situa o Restaurante Caravela, aqui no bairro do Liceu.
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Pelo que conheço dela, a DrªOdete nunca deixou mal vistos, do ponto de vista profissional, qualquer um destes dois enormes advogados que eram naturais de Setúbal.
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Foi por esta altura, de 1962- 1964 (?) que comecei a conhecer mais de perto a, agora, ex-Deputada de Setúbal. Começou a aparecer no nosso círculo no café Esperança, que se reunia nas duas mesas ao pé da tabacaria, junto ao posto telefónico.
Tornou-se uma “habituée” naquele convívio diário, quer a seguir ao almoço quer à hora do jantar. Por vezes estas reuniões davam até bastante tarde. O seu sentido de humor e a sua “teimosia” a defender as ideias que tinha, fizeram dela uma pessoa de quem nos habituámos a gostar.
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Passou algumas vezes por situações bem pouco agradáveis. Numa delas, tanto quanto me lembro, por questões que se relacionavam já com a sua posição política, foi agredida por um “pide” sem escrúpulos, em plena esplanada do Café Esperança.
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Numa outra, nada tendo a ver com situações políticas, e como resultado do “feitio” de ambos os interlocutores, ela e um comum Amigo daquela tertúlia do Esperança, foi obrigada a atravessar a cidade desde o Bairro do Liceu até ao Bairro da Conceição… a pé e às duas da manhã! Um pouco de orgulho ferido. à mistura...

Após terem deixado duas colegas do Grupo do Esperança em casa, no Bairro do Liceu, uma qualquer teimosia resultante da conversa que vinham tendo, levou a que ela, toda “empertigada” tivesse dito ao "condutor", que se tinha disposto a deixá-la também em sua casa, no Bairro da Conceição:
“Oh! Fulano… se você continua a ” bater nessa tecla” eu saio aqui mesmo!…”
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A estas palavras da Odete, cheias de humor, respondeu o amigo que a conduzia, também gracejando, ao mesmo tempo que encostava o Austin 1100 ao passeio da Avenida…
“Se quer sair… é só dizer!...”

E não é que a Odete abriu a porta do carro e deixou o Amigo a falar sozinho, ali quase em frente do Liceu?!... À espera, claro, que aquilo não passasse de uma pequena cena teatral com um final muito aplaudido e um regresso ao “palco” com grande ovação…
Só que o Amigo não aplaudiu aquela “saída pela esquerda baixa”… Carregou no acelerador e só parou na Praça do Brasil…onde morava!
A pobre da Odete viu-se obrigada a descer a pé toda a Avenida, a atravessar a pé todo o Parque do Bonfim, a caminhar até ao Quebedo e a subir a pé toda a antiga Duarte Pacheco até à casa dos Pais no Bairro da Conceição…
Tudo por um “pedaço de teatro”, quase às duas da manhã!
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Anos mais tarde, uns meses após a revolução dos cravos que, como todos sabem, foi bem “dura” aqui em Setúbal, tive conhecimento através de uma pessoa amiga que assistiu à conversa entre os dois, da defesa que de mim fez perante as afirmações maldosas proferidas por um “vereador” da primeira Comissão Administrativa da Câmara de Setúbal, que aqui caiu, feito “paraquedista“...

A pessoa que me conta este episódio, faz-me uma pergunta-afirmação:
“Olhe lá! A Drª Odete é comunista mas deve ser muito sua Amiga… Assisti a esta conversa entre ele e o vereador Fulano…“
E contou-me a defesa que a Odete fez de mim colocando o bancário a pensar que não devia acreditar em tudo o que se diz… Principalmente naquela época de “caça às bruxas”… ao contrário!

Sem nunca ter contado à DrªOdete Santos que soube deste episódio, passado numa viagem oficial, a caminho de Lisboa... fiquei-lhe grato pela defesa que de mim fez naquela época tão atreita a "linchamentos" políticos...

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