Um Amigo de há muito...
Numa Homenagem que a Cidade de Castelo Branco prestou a António Salvado, em 6 de Outubro de 1998, são estas as palavras que o Presidente da Câmara Joaquim Morão lhe dedicou:.
" A dimensão de uma cidade não se mede apenas pelos valores materiais impressos ao longo de gerações no espaço. Na verdade, é o espírito que alicerça, edifica e projecta a grandeza sw qualquer lugar vivido.
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As casas tombam, as ruas desaparecem, as praças disformam-se, a paleta urbana altera-se continuamente. Então, onde residirá a paternidade de um presente que é permanente devir?
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Ensina-nos a história da nossa civilização, que aos grandes criadores devemos a capacidade de nos fazer ultrapassar os limites da efémera existência e de nos fazer participar naquilo que sublima o espírito humano, evocando a beleza da prática de sermos cidadãos, vinculados a um determinado território.
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Na inconstância do bulício há sempre alguém que evoca a plenitude dos silêncios, o encanto das pequenas grandes coisas e, além deste esforço de criação, nos alerta também para as inquietudes da vida.
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.Apraz-nos hoje patentear a um desses criadores e cidadão, o testemunho da nossa admiração.
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Chama-se António Salvado e nasceu na cidade de Castelo Branco."
.Assisti com alguma emoção a toda a cerimónia que se desenrolou no Palácio dos Motas, à Praça Velha, onde, acabado de restaurar, funcionava já o actual Arquivo Distrital.
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António Forte Salvado - 7 de Junho de 1985
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O António Forte Salvado nasceu em Castelo Branco, a 20 de Fevereiro de 1936.
Fez o Curso do Ensino Primário e do Ensino Liceal em Castelo Branco.
Licenciou-se em Letras na Universidade Clássica de Lisboa.
Foi Professor do Ensino Técnico - Profissional e do Ensino Liceal.
Foi Director – Conservador do Museu Tavares Proença Jr.
Foi Vogal do Conselho de Arte e Arqueologia da Câmara Municipal de Castelo Branco.
Foi Membro para a Educação e Cultura, do Conselho Distrital de Castelo Branco
Foi Editor de Cadernos de Cultura "Medicina na Beira Interior - da Pré-História ao SecXX"
É Membro da Cátedra de Poética "Fray Luís de León" da Universidade Pontifícia de Salamanca.
É Prémio Fernando Chinaglia/Personalidade Cultural, da União Brasileira de Escritores.Tem a Medalha de Mérito da Universidade Pontifícia de Salamanca.
Tem a Medalha de Prata da Câmara Municipal de Castelo Branco.
É "O Mais da Beira Interior", votado pelos leitores de O Jornal do Fundão.
Tem a Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura de Portugal.
Tem a Placa e o Diploma de Honra da Universidade de Salamanca.
Um Curriculum de que deve orgulhar-se e nos honra a todos nós, albicastrenses e Amigos do Salvado.
Sou seu Amigo desde os tempos de Escola. Mais novo que eu um ano, o Salvado morava próximo de mim quando tínhamos oito ou nove anos.Já tocava muito bem viola quando passámos a frequentar o "Liceu Novo" (a actual Escola Secundária Nun'Álvares). E entusiasmou-me a aprender a tocar... Paguei-lhe adiantado Sete Lições de Viola por 7$50! Deu-me duas aulas... e depois, um de nós desistiu! Lembras-te disto António Salvado?! Foi p'rá i em 1947...
Nesta foto, obtida em 7 de junho de 1991, na Romagem de Saudade, ainda no antigo palco do "Cinema ao Ar Livre", é o Armando da Conceição a vedeta da viola! O Salvado deve estar ali a fazer as apresentações.
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Em 1961, quando esteve em Angra do Heroísmo, o António Salvado elaborou um Ensaio de Literatura que publicou na Revista Atlândida com o nome de “Itinerário Ascético de Frei Agostinho da Cruz (1540-1619)”
“Frei Agostinho da Cruz nasceu em Ponte da Barca e faleceu em Setúbal. Dizem que costumava “conversar com Deus, com a Virgem, com a natureza e ainda com a sua querida serra da Arrábida”
Houve em Setúbal um Colégio com o seu nome situado no topo sul do antigo campo dos Arcos, hoje desaparecido.
O António Salvado, com o seu Ensaio, é como que um elo de ligação entre dois momentos da minha memória, isto é, entre juventude que passámos no Liceu onde ele já despontava como Poeta e uma fase mais madura em que evoca um “poeta de Setúbal” ou mais propriamente "da Arrábida"…

António Salvado dá as Boas Vindas aos Romeiros da SAudade - Junho/85
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Em dada altura, o poeta albicastrense diz:
”Em Frei Agostinho da Cruz, a solidão apresenta-se também como um (entre outros) estado mortificante aceite com contentamento. A razão deste contentamento encontra-se nas estrofes que transcrevemos da endecha:
Alma entristecida
Façamos concerto;
Vamos fazer vida
Vida num deserto
Entre penedias
E vales medonhos
Onde nem por sonhos
Lembram alegrias
Não haja mais ver,
Quem fale, quem veja;
Tudo, tudo seja
Chorar, e gemer.
Vamos ver da serra
Do monte deserto
O Céu mais de perto,
De mais longe a terra.
“Ver o céu de mais perto, de mais longe a terra ” – eis o autêntico motivo…”a purificação da alma, conduzindo a uma passividade onde a vontade se perde em função de uma mais visível aproximação de Deus.”
Em 1964, num encontro de Natal, o António Salvado ofereceu-me o último livro que havia publicado.
Leituras II - 1994
Diz ele, logo de início que: “Em Leituras II se juntam quatro textos que serviram de prefácio a igual número de antologias por nós organizadas: Antologia da Poesia Feminina Portuguesa (1972), Anunciação e Natal na Poesia Portuguesa (1968), A Paixão de Cristo na Poesia Portuguesa (1969) e A Virgem Maria na Poesia Portuguesa (1970).
Foi simpática a dedicatória que ali escreveu naquele Natal de 1964:

Dedicatória em "Leituras II"
.Numa Antologia que editou em 1985, e me enviou para Setúbal,
Antologia - 1985
o António Salvado escreveu “umas linhas” que me enterneceram por recordarem factos que “também (tão bem!) conhecíamos”…

Dedicatória de Antologia/85
Lembro-me de lhe ter respondido, tarde e a más horas…
"O espaço é grande… E tão pequeno é, quando me lembro do tempo em que ansiavas o futuro já tão perto então!
Esses instantes, que tu e nós também (tão bem…) conhecemos do passado, projectados no futuro que agora vivemos, dão-nos a ternura das recordações que tentamos, de certa forma, voltar de novo a viver…
A lacuna que havia aqui em casa, até há pouco tempo, está agora ultrapassada com os livros que tivesta a amabilidade de enviar-me.
O agradecimento é que pecou pela demora, mas isso eu espero que me perdoes.
Um abraço do amigo de sempre
J.J."