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09 novembro 2009

Galleria degli Uffizi

A Primavera
Sandro Botticelli
1445-1510

A Primavera

A concepção musical da pintura característica de Botticelli tem a sua expressão mais alta nesta célebre pintura da maturidade (c.1478), que a vista não abrange ao mesmo tempo, mas deve “ler” ou “ecoar”sobre o fio melódico da linha da direita para a esquerda. E é um canto evocativo e nostálgico que, no tratamento do tema mitológico, se serve também de discretas alusões ao mundo figurativo da Antiguidade, para evocar, envolvendo-a num tom de sonhadora melancolia, a atmosfera de encantamento e de felicidade do mito clássico. Segundo tradição, o tema alegórico teria sido fornecido por Poliziano, e na realidade encontram-se algumas correspondências com vários versos das Stanze. Sobre o fundo pálido do céu, que aparece através de uma trauma subtil de troncos do laranjal, o arabesco ondulante da linha constrói, na Primavera, as suas variações musicais. E a linha joga livremente com uma entrada em andamento de allegro com fuoco nas primeiras duas figuras da direita, Zéfiro que persegue Flora, para quase esgotar o ímpeto no leve agitar-se dos véus aos pés da ninfa e retomar depois o vigor , descrevendo com um inquieto arabesco os sinuosos contornos do corpo e das vestes da Primavera. Seguem-se o andante da Vénus e o scherzo, em tom de alegretto , das Graças, retomado em adágio por Mercúrio, cuja atitude clássica abranda mas não põe fim à melodia, que parece terminar, perdendo-se no espaço, fora do quadro.
A Primavera é uma pintura que possui uma irresistível sugestão musical integrada na própria estrutura da composição. Embora a concepção da perspectiva do espaço não seja negada, não é já o jogo dos volumes inseridos no espaço que vai articular a composição, mas sim a linha na sua evolução. Assim a unidade da visão surge, como na poesia e na música, na sucessão ”temporal” das figuras. A linha resume e resolve por si o movimento dos volumes e o seu conteúdo espacial, tudo arrastando consigo no seu desenvolvimento melódico. No grupo das três Graças a linha passa musicalmente de uma para outra das três cândidas figuras – materializadas por uma cor pálida e transparente – como por sinuosas palavras melódicas, através do cruzamento dos braços para terminar ao alto, no trillo agudíssimo dos dedos entrelaçados.
O encanto poético destas figuras é enriquecido pela alusão ao motivo clássico das Graças, conhecido, muito antes da descoberta do famoso quadro de Pompeia, através de diversos grupos estatuários. Assim como numa composição poética a alusão ao verso de um antigo poeta no novo contexto enriquece a nova poesia como uma música antiga.
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Cfr. Roberto Salvini
In “Grandes Museus do Mundo
Ed.Verbo – Setembro/1973

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