In “Público”
2010 02 03
Santana Castilho
Professor do ensino superior
Num século fez-se muito. Mas não se fez o possível, muito menos o desejável. A República tem cuidado pouco de todos os cidadãos e permitido que alguns cuidem escandalosamente de si próprios e dos seus, em detrimento dos outros.
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Ao arrepio destes valores, muitos representantes da República, impreparados e incultos, sem réstia de sentido de Estado, tomaram a escola e os professores, os tribunais e os juízes, os hospitais e os médicos como cobaias sociais, para aí experimentarem tecnocracias neoliberais e e fomentarem hediondas invejas sociais. A subida ao poder desta casta de atrevidos colocou o Estado em licença sabática primeiro, para o entregar depois à gula do negócio, da corrupção e do esbanjamento. É tempo de a República dizer basta.
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O Ministério da Educação carece de uma desinfestação que varra a ortodoxia pedagógica e o centralismo burocrático que o dominam. A sua estrutura orgânica, no que importa intacta há trinta anos, deve orientar-se para a verdadeira autonomia das escolas e ser posta ao serviço do controlo da qualidade, da supervisão do sistema e da concepção das políticas educacionais da República. As direcções regionais são um bom exemplo de excrescências administrativas a extinguir.
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Os jovens não podem continuar a ser sequestrados nas salas de aula de manhã à noite. A escola não pode tratar de tudo. É preciso fazer escolhas, definir prioridades para cada ciclo de estudos e ser exigente em todos. A “escola inclusiva” e a “escola a tempo inteiro”, tal como têm vindo a ser postas em prática, a “área de projecto”, o “estudo acompanhado”e outras epígrafes pedagógicas diletantes são, também, bons exemplos de tumores a extirpar..
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Porque está errado pensar-se que a escola se realiza sem disciplina, sacrifício e trabalho. Porque está profundamente errado que os pais tenham deixado de ser os primeiros aliados dos professores na modelação dos filhos. A autoridade é uma referência indispensável ao crescimento saudável das crianças. A sua presença deve começar em casa e prosseguir na escola. A escola e os professores não podem pactuar com pais que querem que o pouco tempo que passam com os filhos seja um tempo de doces afectos, livre de conflitos e do trabalho que dá disciplinar. E aqui chegados, tropeçamos numa das maiores inutilidades do sistema: o estatuto do aluno, onde os regimes de faltas e disciplinar e as provas de recuperação são hinos à imbecilidade desprovida de sentido. É dever da República devolver aos professores a soberania suficiente para disciplinarem de forma célere e expedita. É dever da República conferir às faltas injustificadas à escola consequências sérias, pelas quais devem responder, de modo efectivo, pais e filhos. Roma não pagava aos traidores. A República não deve pagar a irresponsabilidade e os formalismos inúteis.
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Excertos da coluna que Santana Castilho publica
no jornal "Público" e que saíu com o título:
"Urge refundar a escola da República"
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