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06 fevereiro 2010

Não se pode confiar...

Excertos de um "Comentário"
"Como se pode confiar neles?"
Por Manuel Carvalho
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Manuel de Carvalho

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O que ontem foi revelado em Portugal não pode, ser recebido com mais um encolher de ombros. Os indícios são de tal forma graves que, se confirmados, tornam a democracia portuguesa uma farsa e o estado de direito um devaneio lírico.
Cansado de tantas suspeitas, informações, denúncias ou críticas sobre a relação entre José Sócrates e a liberdade de imprensa, o país já fica imune... Mesmo quando, como agora acontece, essa acção é valorizada por magistrados e exposta em telefonemas de personagens do PS que constantemente invocam o seu nome.
Ou quando esses telefonemas não aludem a uma exasperação acidental num restaurante, mas a um plano premeditado, que envolve conspiração nos bastidores e imposição a empresas nas quais o Estado tem uma golden share.
Mas se a acção atribuída a José Sócrates nos leva para a imaginação de Hollywood, a reacção do poder judicial transporta-nos para uma ditadura africana
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Pode ser que muitas escutas, a maior parte até, se limitem a comentários sobre o estado do tempo. Mas depois de se ler as que ontem foram divulgadas, é difícil não reconhecer razão aos magistrados de Aveiro. O que elas mostram é, no mínimo, uma série de "fortes indícios" sobre a existência de um plano que configura um atentado ao estado de direito. No seu fluxo, percebe-se que os protagonistas que invocavam o nome do primeiro-ministro na operação para calar a TVI sabiam do que falavam.
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Se o que se diz do primeiro-ministro reforça apenas uma suspeita antiga, a facilidade com que Pinto Monteiro e Noronha Nascimento remeteram para o arquivo os indícios que lhes chegaram de Aveiro merece maior preocupação.
Com esta etapa, a intolerância de Sócrates para com a liberdade de imprensa não se revela - apenas se adensa; já os receios de que o princípio da separação de poderes está em Portugal ameaçado pelo desempenho dos principais magistrados do país ganham uma nova e substantiva força. Por muito que falem e se expliquem com alíneas e jurisprudência, será agora mais difícil fazer parte do país acreditar na sua independência face ao poder político. As suspeitas valem o que valem, mas, no caso, valem o suficiente para minar a credibilidade do estado de direito. A sua demissão seria um bálsamo para este país doente.
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in "Público"
Manuel Carvalho
06 02 2010

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