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20 fevereiro 2007

Soneto

Nicolau Tolentino (1741 – 1811)

Chaves na mão, melena desgrenhada,
Batendo o pé na cama, a mãe ordena
Que o furtado colchão, fofo e de pena,
A filha o ponha ali ou a criada.

A filha, moça esbelta e aperaltada,
Lhe diz coa doce voz que o ar serena:
--“Sumiu-se-lhe o colchão?! É forte pena!
Olhe não fique a casa arruinada…”

--“Tu respondes-me assim? Tu zombas disto?
Tu cuidas que, por ter pai embarcado,
Já a mãe não tem mãos?” E, dizendo isto,

Arremete-lhe à cara e ao penteado.
Eis senão quando (caso nunca visto!)
Sai-lhe o colchão de dentro do toucado.


Sobre Tolentino, escreveu o Dr.José Rodrigues Lapa:
“… este humorista, um dos maiores da nossa literatura, teve uns olhos extraordinários para ver as realidades e um talento de primeira ordem para no-las tornar presentes, sensíveis. A alta sociedade ficou naturalmente fora da sua actividade satírica: não iria pintar os ridículos de quem lhe dava o peru…”

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