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23 julho 2010

A Lusófona Guiné Equatorial...

A possibilidade de a CPLP vir a ter em breve membros onde até há pouco não era usado o idioma de Camões é muito polémica. Presidente Obiang vai estar em Luanda.
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Sócrates diz que a adesão da Guiné Equatorial não será decidida em Luanda.
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Reproduzo dois "apontamentos", a ter em consideração, e que podemos ler no "Público" de hoje..

Eduardo Lourenço

A CPLP não é o tonel das Danaides

O espaço da comunidade dos povos de língua oficial portuguesa define-se mais em termos de cultura do que em termos de soberania ou soberanismo mesmo virtual. Constituem-no nações politicamente independentes, situadas em três continentes, com laços históricos seculares com a pequena nação europeia que chamamos Portugal. Apesar desses laços, de leitura diversa segundo os casos, o único que pode legitimar a utopia histórico-geográfica que designamos por CPLP é a partilha, também ela complexa e diversificada, do português como língua oficial dos países dessa comunidade, assumida como tal, e enquanto o for. Fora dessa partilha o conceito, algo voluntarista da CPLP, não teria ou não pode ter sentido algum, nem histórico nem cultural.Parece que uma nação africana próxima da nossa antiga colónia da Guiné-Bissau manifestou o seu interesse em participar também nessa comunidade de inscrição cultural lusófona. Se a CPLP fosse uma mera associação de nações com interesses económicos mais ou menos convergentes, o desejo da Guiné Equatorial de querer participar nela seria apenas uma questão de ordem política empírica a ser resolvida entre os membros da CPLP e a nova postulante. Não é o caso. O estatuto da CPLP é apenas o da ordem cultural, quer dizer, o vínculo linguístico. Pela natureza das coisas a Guiné Equatorial por enquanto está fora do critério que justifica e onde se inscreve a sigla CPLP. Questão não posta está resolvida por si. De outro modo a CPLP seria apenas a versão africana do tonel das Danaides: preciosa água escorrendo em vão para lado nenhum. Ensaísta.
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NB - Eduardo Lourenço é irmão do falecido Dr.António Faria, que foi médico em Setúbal e do meu colega Adriano Lourenço que foi professor de Biologia em Coimbra.
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Mia Couto
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A “Opinião” de Mia Couto

Durante anos, o regime da Guine Equatorial foi um triste símbolo daquilo que não podia ser tolerado em África: um governo nascido por artes golpistas, um sistema mantido pela criminosa negação da democracia. Alguns governos que se proclamam arautos dos direitos humanos fizeram campanha contra a ditadura até que se provou existir petróleo no território guineense. Trocaram, então, a conveniência pela conivência, a solidariedade pela cumplicidade do silêncio. A CPLP podia marcar diferença nesta hipocrisia das relações internacionais. Perderia em número aquilo que ganharia em prestígio e coerência. O Presidente Teodoro Obiang poderá adoptar, na Guiné, a língua portuguesa. Mas existe um outro idioma que é o dos valores da liberdade. Esse idioma - que foi negado na Guiné Equatorial - deveria ser o critério maior para admissão na família da CPLP.Talvez eu nunca tenha sido muito da CPLP. Agora, a CPLP deixará um pouco mais de ser minha.

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