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25 junho 2008

Escrito no vento...

Uma aula prática na "Quinta da Polida"...
num dia de S.João...
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Despontava o dia de S.João... e às 6h 30m da manhã, já estava à porta da casa do "Velho Isidoro" em casa de quem moravam o Júlio Casaleiro e o Aprígio Meireles. Devíamos estar muito cedo na Quinta da Polida. O Manuel Boleo também já estava acordado e também foi connosco.
Dirigimo-nos então para a quinta da Zezinha, deixando para trás o Largo da Sé, o Liceu Velho e a estrada da Mina. Quando ali chegámos à Polida, já lá estavam com a Zé, a Júlia Costa e a Ildinha do Carmo Silva. Logo a seguir chegaram a Conceição Faria, a Susana e a Marília.
Dos rapazes apareceram também o Paralta de Figueiredo, o Armando da Conceição e o José Joaquim Delgado Domingos.
A aula prática combinada teve a adesão esperada.
Com a mesa preparada, que a Zezinha tinha colocado ao ar livre no espaço em frente da casa dela, com as tesouras, bisturis, pinças, alfinetes, algodão e outro material necessário às dissecções e com as “vítimas” à espera do sacrifício em nome da ciência, coube-e a mim iniciar o “ritual”…
Fui eu quem iniciou a operação e começamos por dissecar primeiro o Pombo. O Júlio Casaleiro tinha-se colocado à minha esquerda, tendo ficado à minha direita a Júlia Costa. No outro lado, à minha frente, postaram-se a Susana Vaz Oliveira, a Conceição Faria e a Zezinha.
A ausência da “Tia Anica” (era a professora de Ciências Naturais, D. Julieta Neves) deu azo a que aquela aula se processasse com alguma picardia por parte de algumas daquelas assistentes… com a Zezinha “comandando” as piadas que o “operador” de serviço, e a “assistente” colocada à sua direita, tiveram de “suportar”…
Correu muito bem a dissecação do pombo e ali foi recapitulado tudo o que havia a saber sobre as “entranhas deste animal”… que apareceria, com grandes probabilidades, numa das bancadas da sala do laboratório que seriam tiradas à sorte no dia do exame…
Atacámos depois a Rã e tudo correu normalmente com o estudo prático da sua anatomia…

Foi no fim desta dissecação que o Zé Joaquim Domingos, o Paralta, a Marília e a Maria da Conceição desandaram de ao pé de nós, provavelmente fartos da carnificina… ou de não terem podido, eles próprios, executar a tarefa de “operador” principal…
Apenas com quatro ou cinco à roda da “bancada de trabalho”, era agora a Júlia Costa que me dava os bisturis, as tesouras, os alfinetes quando eu fazia menção de os procurar. Até parecia uma competente “enfermeira” auxiliar de um “grande operador”… Esta “parelha médica” ouviu então algumas boas piadas, em especial da Conceição Faria e da Zezinha e conseguiram pôr-me nervoso. A mim e à Maria Júlia… A ponto de a ter magoado com a ponta do bisturi ou das tesouras por uma ou duas vezes quando lhe pedia ou lhe entregada aqueles instrumentos de trabalho… Aceitava sempre as desculpas com muita simpatia… Da última vez que tal sucedeu a Julinha chegou a dizer-me: “Vê-se mesmo que está com vontade de me fazer mal…”
Passámos depois à dissecação da “barata” e, a seguir, ao "coelho".
Quando abri a segunda “barata”, a minha assistente afastou-se por uns momentos... mas depois voltou ao trabalho quando iniciámos o a dissecação de um Coelho!
Na verdade, quer a morfologia externa quer a anatomia da barata… são nojentas!!!
No início do trabalho de dissecação do coelho, quando eu ia pegar numa tesoura que por ali estava à mão de semear, ouvi a Júlia dizer-me que pegasse noutra porque aquela não prestava… Ao mesmo tempo que a pousava, para pegar numa outra, perguntei-lhe quem era a dona da tesoura ao que ela respondeu:
É minha.
Logo vi…” respondi eu e notei que a Júlia quase perdeu a fala… Ficou calada, mas logo voltou à carga.
Mas porque é que você disse isso?
Não lhe dei troco. Estava trabalhando com as vísceras do coelho. A um passo de iniciarmos a revisão daquela anatomia, fingi que não a ouvi.
Mas pouco tempo depois ela insistiu na pergunta:
Está a ouvir?!... Porque é que disso aquilo há bocado?
Nesta altura parei o trabalho, pousei o bisturi e voltei-me para a minha esquerda onde ela estava sentada, à minha beira e de onde me fazia aquelas perguntas quase ao meu ouvido, olhei para ela com um sorriso “malandro”… lavei as mãos num alguidar com água limpa que a Zezinha ali tinha mandado colocar e, com a maior das calmas, continuei o trabalho… sem nada lhe dizer.
Tínhamos começado muito cedo a recapitular os temas do Exame Prático. Eram 10h 30m quando todos fomos para a cidade, direitos ao Liceu para que a Tia Anica nos explicasse o funcionamento da “Balança de Jolly”...
(do físico alemão Philipp von Jolly - sec19)
...... (escrito no vento há 55 anos... em 24 de Junho de 1953))

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