Com a próxima Romagem de Saudade, a acontecer dentro de 15 dias, pareceu-me pertinente evocar um texto assinado pelo Dr.Jorge Seabra, de saudosa memória, que foi publicado na "Beira Baixa", em Março de 1956, um pouco antes da 2ª Romagem de Saudade.
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Dr.Jorge Seabra - Março de 1956
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“Quanto eu, Senhor, não sei al que diga senão: - Russos além!” Eis a espirituosa resposta dada por um dos velhos combatentes de Aljubarrota – João Gomes da Silva – ao ser-lhe perguntado no Conselho de Estado, pelo Rei – o Mestre de Aviz – qual a sua opinião acerca da expedição a Ceuta.
Pois bem: - Presentemente, a “coisa” não mete arrancada bélica a qualquer praça marroquina, nem “russos” de Aljubarrota a desancarem de montante em punho, as aguerridas hostes agarenas, – mas, tão somente, uma amena e saudosa passeata a Castelo Branco dos russos, dos encanecidos escolares do seu Liceu. Os anos – é certo – enfarinharam-nos um tanto os cabelos e salpicaram-nos de rugas a tisnada face; - mas a alegria que nos vai na alma ainda não secou, ainda não murchou, prometendo prolongar-se por aí fora com a frescura e a vivacidade doutrora…
O entusiasmo por esta nova “Romagem” à sedutora "Castraleuca" – terra admirável e onde ensaiámos os primeiros voos para a árdua labuta da vida – é cada vez maior, não cessando os variadíssimos Fernão Lopes e Azuraras da antiga malta estudantil, da badalar, em crónicas sumarentas e altissonantes, o grande facto.
Há já quem não durma nem lhe afinfe convenientemente no caldo verde só de pensar que, dentro em breve, abraçará, louca e freneticamente, os velhos camaradas da juventude. E que alegria não vai ser a nossa ao desabarmos, frescos e exuberantes de seiva, sobre as largas e honradas peitaças dos companheiros de há meio século! Não há temperamento, por mais empedernido e indiferente que seja, que não vibre, que não se comova com a ideia desta segunda Romagem à remoçada Capital da Beira Baixa.
É necessário aproveitar o tempo, pois, como se sabe, a coisa já vai um tanto esticadita… E a Festa, para cujo esplendor todos trabalhamos ardorosamente, irá, por certo, resultar um miminho, uma autêntica formosura… Eu – com o coração a retouçar-me no peito – já ouço o ranger dos castelos e as cristalinas gargalhadas dos belos camaradas dantanho. E vejo os cafés, os bars, os hotéis e as amplas avenidas da linda e rejuvenescida cidade de Castelo Branco transbordando de alegria… como diz o “meu velho amigo e querido condiscípulo Frederico Conde – ando p’ráqui, há um ror de tempo, a fazer de Pedro Eremita, pregando uma nova cruzada a terras da Beira Baixa". Esta segunda Romagem está, graças a Deus, no ânimo de todos, supondo que não será necessário ir muito mais além em farfalhuda propaganda para que desabe lá o “Carmo e a Trindade”. Maio está à porta e as maletas – limpas, espanejadas e expurgadas de teias de aranha – encontram-se já aptas para acolherem, com dignidade, as engomadas camisas e as vistosas e pintalgadas gravatas.
Estas coisas de reuniões de antigos escolares não se decretam nem se impõem… Ou estão no sangue e no coração de todos – e vai tudo, ou não estão… e não vai ninguém.
Mas, mercê da vontade de Deus e da nossa indestrutível amizade, … irá tudo, adivinhando-se uma festa rija, atraente e sem precedentes nos anais da vida académica albicastrense.
Quanto a mim — confesso – já não paro, como com o costumado apetite, só de pensar que, daqui a umas semanitas, regressarei ao dinamismo e à alegria dos vint’anos!
Irá tudo, minha gente: -- de Tinalhas, de Alcains, do Ninho do Açor, de Benquerenças, do Ladoeiro, do Porto, de Lisboa, das Ilhas Adjacentes, etc. E os de Castelo Branco se não vão – é porque já lá estão… Corações, pois, ao alto e… toca a andar, numa sedutora arrancada, até à formosíssima princesa da Beira Baixa – terra dos nossos amores e por onde se espraiou, em irreverências várias, a nossa longínqua e saudosa mocidade. E agora, por certo, até breve.
Até breve queridos rapazes…
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Porto – Março – 956
Jorge de Seabra
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