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22 junho 2020

Uma oferta de valor...


... que o António Salvado me fez.
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Lembra-se com frequência da amizade que criámos desde os oito ou dez anos durante o tempo de nossa Juventude que... já há muitos anos deixou de ser jovem... Oferece-me alguns livros de sua autoria, com uma frequência incomum. E, todos eles,sempre com uma dedicatória que com regularidade vai parar quase sempre aos "anos quarenta" e ao Jardim do Paço onde eu e ele, e tantos outros, íamos parar aos sábados de tarde com as respectivas namoradas... O Reitor de então, de má (mas também de boa...) memória, não "permitia" namoricos... naquele nosso Liceu...
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 Capa do Livro "Leituras XI"... 
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...e a dedicatória referida
António Salvado dedicou esta sua obra ao seu filho, também poeta, Gonçalo Salvado.

"Ao poeta Gonçalo Salvado que na castália do 
"Cântico dos Cânticos" 
tem bebido muita da sua inspiração."
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De uma breve "Introdução" que o António Salvado nos apresenta, pudemos retirar alguns excertos que considero de valor.
"Exemplo da mais lídima poesia para uns, texto essencialmente de teor religioso para outros, o Cântico dos Cânticos, (título que é suporte de um superlativo hebraico a significar que esse "Cântico é o mais excelente de todos os Cânticos"), constitui a materialização e a revelação em versículos bíblicos de um amor profundo e apaixonado entre uma pastora e um pastor e de ressonâncias líricas tão efusiva que os próprios místicos hebreus e cristãos nele colheram a linguagem simbólica para exprimirem as suas relações de amor com Deus".
(...)
... o Cântico dos Cânticos tem sido considerado também uma obra-lírico dramática e cénica, a aglutinação de um ciclo de cânticos nupciais ou, ainda, uma profunda alegoria místico-religiosa... E isto, se tivermos em mente o número elevado de interpretações, ele é, acima de tudo, um belíssimo poema de amor no qual se descortina a paixão de dois amantes que, vencendo e ultrapassando 
circunstancialidades negativas, conseguem atingir a perenidade da sua ligação amorosa. E, nesta directriz, convenhamos que o Cântico dos Cânticos, procurando narrar embora a história de um amor terreno, conserva sem dúvida um valor transcendente.
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(...) 
Um dos documentos sumérios encerra precisamente um belíssimo 'Conto de Amor' cujos inúmeros contactos com o Cântico dos Cânticos, formalizam, na verdade, elos indiscutíveis.. Nesta perspectiva, assinalemos a similar atmosfera amorosa entre amada e amado, colorida por confissões reveladora de apaixonado enlace; os traços descritivos relativamente à beleza dos seres amados; os tons paisagísticos da cena que serve de pano de fundo ao desenrolar do enredo amoroso, etc.; similitude fácil ainda de ser apreendida no que diz respeito a substantivos (coração, beleza, mel, carícia prazer...), adjectivos (caro, agradável, doce, preciosa, saboroso, fremente...), verbos (cativar, levar, acariciar, permanecer...) ou expressões como "dormir até ao amanhecer, "favor das tuas carícias, "doce é a sua beleza", "alegrar o teu coração", "dormir na nossa casa", "ergue o teu rosto para mim", "que me escolheste", "cola a tua mão sobre...", "noiva deixa que te acaricie", "noiva, tu de mim tomaste o teu prazer", "com os lábios, doce é o seu sexo, doce é a sua beleza"; similitude ainda, no referente a objectos como "pendente de oiro", "anel de oiro", "anel de prata"; e à figura da mãe, presente no desenrolar da estória amorosa. 
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António Salvado

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Cântico dos Cânticos



Beija-me com a doçura dos teus lábios...
Bem mais inebriante do que o vinho é o seu ardor...

E o cheiro do teu perfume
é cheiro de ternura...
O teu nome?:
um som aromático a escorrer...
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Por todas estas coisas
é que as raparigas se perdem por ti!...
Leve-me, então, contigo!...
Vamos, vamos embora!...

O rei já me meteu nos seus aposentos,
mas só contigo a minha alegria será
bem sentida,
e muito mais que o vinho
é a tua ansiedade
que me há-de pôr fora de mim!

Ah! Não surpreende
que tu sejas desejado por todas as raparigas!

Ó raparigas de Jerusalém:
sou trigueira, mas formosa, 
como as tendas da tribo de Quedar
ou como as peles de Salma...
E não olhem para mim com desprezo!...
Se sou morena,
é porque o sol me queimou!

Os meus irmãos
contra mim se enfureceram:
tinham-me posto a guardar vinha
e... eu
não soube guardar a minha própria vinha...
E diz-me lá, querido da minha'alma,
a que pascigo levas o teu gado,
onde o recolhes ao meio dia,
para que eu não erre assim,
perdida
atrás dos rebanhos dos teus companheiros...

Se não o sabes,
ó mais bela das raparigas,
 vai seguindo as pisadas das ovelhas
e apascenta os teus cabritos
junto das cabanas dos pastores.

Comparo-te, ó minha querida,
à égua atrelada de um carro do Faraó...
E as tuas faces são tão belas como pérolas,
o teu pescoço, entre os brincos,
é lindo como colares...
E hei-de mandar que te façam
arrecadas de ouro
marchetadas de prata.

Enquanto o rei descansa no seu leito,
o meu nardo lança perfumes para o ar...
O meu querido é um saquinho de mirra
a repousar, deitado, entre os meus seios...
Para mim, o meu querido é como um cacho de alfenas
das vinhas de En-Guídi.
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Tu és tão bela, minha querida,
tu és tão bela!...

E como os teus olhos são iguais
aos olhos das pombinhas...
.
E como tu és belo, meu querido,
tão cheio de delícias...
E o nosso leito estende-se sobre a verde relva...
As traves da nossa casa são de cedro
e o seu teto de cipreste...

Sou um narciso de Saron,
sou um lírio dos vales...
E como um lírio entre espinhos, 
assim a minha querida no meio das raparigas!

Entre os jovens, o meu querido é como uma macieira
nas árvores de um pomar...
Ah! Como desejo sentar-me à sua sombra
e trincar na boca os seus frutos deliciosos...
Ele levou-me para a adega do vinho
e contra mim desfraldou a bandeira do amor!
Reconfortem-me com passas de uva,
reanimem-me com maçãs -
eu estou doente de amor!...
Que a sua mão esquerda sustenha a minha cabeça
e que me abrace com a direita...

Peço-lhes, ó raparigas de Jerusalém,
pelas corças e gazelas dos campos:
não acordem, não despertem
o meu querido
antes de ser esse o seu desejo.

Ouço a voz do meu querido! Aí vem ele
a correr pelos campos, a pular pelos outeiros!...
O meu querido assemelha-se a um gamo
ou ao filhote de uma gazela.

Mas ali está ele, parado.
atrás da nossa parede, a espiar pela janela,
O meu querido eleva a voz e diz-me:
"Anda, minha querida, beleza minha,
e vem para junto de mim...
Olha: o inverno já passou e já parou a chuva...
As flores brotam na terra, 
está a chegar o tempo da poda
e na nossa terra já se ouviu o arrulhar da rola...
E já vai dando figos a figueira
e as vinhas em flor largam o seu perfume.
Anda, minha querida, ó beleza toda minha
e vem!
Tu, minha pomba, aninhada nas fendas dos rochedos,
escondida nos buracos  dos barrancos,
mostra-me o teu rosto, deixa-me ouvir
a tua voz -
a tua voz tão meiga e o teu rosto tão encantador!...
(...)
.
.
(...)
Grava o meu nome como um selo
no teu coração,
cola-me como uma tatuagem sobre o teu braço!,
porque o amor é forte como a morte!,
a paixão cruel como um abismo
e as suas chamas são chamas de fogo
labaredas de Yaveh!...
Um dilúvio não seria capaz de destruir
o fogo do amor,
nem um rio apagá-lo!...
E ainda que alguém oferecesse todas as riquezas
 da sua casa para comprar o amor,
esse alguém
havia de ser tratado com o maior dos desprezos!

A nossa irmã é muito pequenina
e não tem ainda maminhas...
Que havemos de fazer à nossa irmãzinha
no dia em que vierem pedi-la para casar?
Se ela for uma muralha,
havemos de construir nas ameias
um coroamento de prata
havemos de guarnecê-la com pranchas de cedro...

Eu sou uma muralha
e os meus seios são as suas torres
e, aos olhos dele,
apareci para lhe trazer a paz!

Salomão tinha uma vinha em Baal-Hamon
e entregou a vinha a rendeiros:
cada um
lhe daria pela colheita
mil moedas de prata...
A minha vida é só minha!
Para ti, Salomão,
as mil moedas de prata e que fiquem os rendeiros,
que dela colhem o fruto,
com duzentas moedas!...

Ó tu que vives nos jardins,
os meus companheiros
estão atentos para ouvir a tua voz...
Faz-me então ouvir a tua voz!..-

Corre meu querido, corre para mim como um gamo
ou como o filhote de uma gazela
que lá vão assaltar
pelos montes perfumados.
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E termina assim esta versão do 
"Cântico dos Cânticos" apresentada pelo 
António Salvado
um dos poucos 
Bons Amigos 
que ainda guardo, com muita estima desde os tempos da nossa 
"Juventude"...
Recebe um Abraço grande
do
jjmatos

1 comentário:

António Teixeira e Castro disse...

Uma excelente prova de amizade e estima esta sua a António Salvado, poeta que também a mim, numa delicadeza embaraçosa me oferece há muitos anos os seus trabalhos poéticos e não só, sempre dedicados com estima!