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12 junho 2021

As memórias...

... do Dr. José do Soveral Rodrigues.
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Dr. Soveral Rodrigues
18.11.1905 / 01.12.2004
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É a extraordinária memória do Dr.Soveral Rodrigues que nos conta:
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"Viveu em Setúbal, no princípio do século, e era um homem "bruto", boçal, com poucos "princípios" e veterinário. Chamava-se Bandeira.
Uma viúva achou piada ao Bandeira, pegou namoro e casou com ele.
Passados meses a viúva morreu. O Bandeira herdou uma fortuna enormíssima e como queria entrar na Alta Sociedade, no tempo de D. Carlos, comprou ao Rei um título e uma herdade que ele tinha e era chamada Herdade de Montalvo.
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Foi assim que ele ficou conhecido pelo Visconde de Montalvo.
Era dono de uma casa, um rés do chão alto com um pequeno jardim à sua volta, ainda existente, junto à Igreja de StºAntónio, na rua Nova da Conceição onde, até aos finais da década de 60, viveram a família Ponte Lopes, num dos lados, e o João Marcelino, conhecido por "Meu Menino", no outro lado e onde, ao tempo da revolução do 5 de Outubro, viviam os pais do Dr. José do Soveral Rodrigues, num lado e os do Dr. Leão Duarte, no outro, sendo estes, ambos, ainda muito miúdos.
O Bandeira era avô do Dr. Bandeira Ferreira, excêntrico primo do Vasco Serra e que, no início dos anos 70, era membro do Instituto do Património, ao tempo chamado "Instituto dos Monumentos Nacionais" (?), e tanto mal causou à terra onde nasceu, ao ter contribuído para a reprovação sistemática dos projectos de remodelação do Largo de Jesus que, sucessivamente, a Câmara de Setúbal apresentava, para que, sobre eles, os Monumentos Nacionais dessem o seu parecer. O Arquiteto Castro Lobo, falecido há uns anos atrás, viu três desses projectos serem rejeitados, sob a batuta deste "descendente do Visconde", qualquer deles muito melhor do que aquele que a Câmara Socialista acabou por aprovar uns anos depois, e lá se encontrava ainda, até há um ano atrás, para vergonha de quase todos os Setubalenses...
Mas voltemos ao Bandeira inicial. Apesar de Visconde continuava a ser um bruto... (não tanto como o Madeira..., acrescentaria o Dr. Soveral Rodrigues...).
O Visconde andava sempre atrás do Calafate para este lhe fazer uns versos, até que um dia, farto de o ouvir, António Maria Eusébio lhe respondeu.
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"Pois, então, senhor Bandeira, 
lá vão hoje os versos que o senhor me pediu.":

"P'ra que serve ao senhor Bandeira
Na casaca ter primor?
E p'ra que serve essa flor
Que fede mais do que cheira?
P'ra que serve essa cacheira
Feita com tanto trabalho?
E mais um "pindoricalho"
Que à cinta fica pendente
A bater constantemente
Na cabeça do c...
Sim!!... P'ra que serve ao senhor Bandeira?!..."

Subentende-se que o Calafate poderia ter acrescentado:
"Se você continua a ser uma grande besta..."
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Pela memória do Dr. José Soveral Rodrigues
em 27 de Julho de 1994, durante o almoço,
no Restaurante do Hernâni, na Lagoínha.
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Nota 1 
O Dr. Leão Duarte era filho único do Dr. Leonardo Duarte que chegou a ser Tesoureiro da Câmara e teve uma grande paixão pela filha do então Reitor do Liceu Dr. Nunes de Almeida.
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Nota 2 
No "palacete" de rés de chão alto, atrás mencionado, e no qual moraram, naquele tempo, os "meninos" Zé Soveral e Leão Duarte, a família do primeiro ocupava o lado direito do prédio, i.é., do lado do Quebedo, enquanto que a família do segundo ocupava o lado esquerdo, ou seja, o lado poente.
Mais tarde, o João Marcelino Nunes viveu na casa do Dr.Soveral Rodrigues, tendo o Dr. Ponte Lopes alugado a casa onde viveu a família do Dr. Leonardo Duarte.
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Em 1970, vive no rés do chão, do lado esquerdo, o sr. Dr. Bandeira Ferreira, (um excêntrico primo do também excêntrico Vasco Serra), que foi em tempos Professor assistente da Faculdade de Letras em Lisboa.

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