Vasco Pulido Valente
continua a ser lúcido, eficaz e muito certeiro...
numa crónica a que deu o título de
E n v e l h e c e r
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Vasco Pulido Valente
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Crescentemente, quando vejo televisão
(sobretudo os noticiários), este Portugal onde nasci e, mal ou bem, vivi setenta
anos, me parece um sítio desconhecido e hostil, em que não posso continuar. Os
velhos são assim e já Chateaubriand dizia: é muito duro envelhecer, mesmo se o
mundo à nossa volta não muda ou muda pouco, mas muito mais duro é envelhecer num
mundo que mudou. Precisava de um livro para explicar o que me irrita neste país
novo da crise e da miséria e, como não tenho força e paciência para começar um
livro, resolvi ir escrevendo sobre as coisas que me exasperam mais. Por
exemplo:
1. A desvergonha com que a esquerda usa a desgraça dos portugueses
como argumento político. Desemprego, impostos, salários ou, no dia-a-dia,
urgências que não funcionam, o remédio para a hepatite C que não há, outro
desconto ou proibição – tudo serve, não se percebe como, para demonstrar a
enorme virtude do PS e a imensa maldade do governo. Nós bem fugimos desta
ladainha. Só que ela nunca pára e não nos larga.
2. A multidão de salvadores da Pátria, que prometem o céu e que
entretanto se juntam e separam, avançam e recuam, como se andassem num jogo de
possessos sem sentido e sem fim. E que berram e se esgadanham por esses debates,
despejando lugares-comuns com uma estranha importância e uma grande
satisfação.
3. A maneira como o jornalismo gira à volta do desastre, do crime e
da pequena história de “interesse humano”, numa altura em que Portugal e a
Europa se desfazem.
4. A obsessão incrível e paradoxal com restaurantes, que abrem às
centenas (apesar do IVA) e que se pretendem sempre pioneiros de uma especial
cozinha ou de uma extraordinária ideia; e que têm na cave vinhos sem igual. Quem
lá vai? A classe média que se destruiu, os banqueiros que faliram, os corruptos
mascarados que esperam a sua hora?
5. A obsessão geral com o espectáculo; com qualquer sítio onde se
juntam milhares de bípedes, saltando e pulando e muitas vezes guinchando, para
seu contentamento e nossa aflição. Os “festivais” da carne, da fruta, do queijo,
do enchido, do mexilhão, do doce regional ou nacional, da primeira coisa que dê
para armar a tenda e ganhar uns tostões.
6. A futilidade da conversa sobre a economia, como se por aqui
ainda não se percebesse que a economia não é uma ciência, é um capítulo da
política.
7. A inferioridade que revela o culto de Ronaldo –
nome obrigatoriamente precedido por o “melhor do mundo” – e o de uma dúzia de
personagens menores que se tornaram “os melhores” de qualquer coisa ínfima ou
gratuita.
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