Num poema a que
Eugénio de Andrade
intitulou
"Os trabalhos da mão"
.
Eugénio de Andrade
(visto por José Rodrigues - 1977)
.
Os trabalhos da mão
.
Começo a dar-me conta: a mão
que escreve os versos
envelheceu. Deixou de amar as areias
das dunas, as tardes de chuva
miúda, o orvalho matinal
dos cardos. Prefere agora as sílabas
da sua aflição.
Sempre trabalhou mais que sua irmã,
um pouco mimada, um pouco
preguiçosa, mais bonita.
A si coube sempre
a tarefa mais dura: semear, colher,
coser, esfregar. Mas também
acariciar, é certo. A exigência,
o rigor, acabaram por fatigá-la.
O fim não pode tardar: oxalá
tenha em conta a sua nobreza.
.
in "Ofício de paciência"
Fundação E.de A., 1994
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