um poema de
Guerra Junqueiro
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Canção perdida
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Hálitos de lilás, de violeta, e d'opala,
Roxas macerações de dor e d'agonia,
O campo anoitecendo e adormecendo, exala...
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Triste, canta uma voz na síncope do dia:
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Alguém de mim se não lembra
Nas terras d'além do mar
Ó Morte, dava-te a vida,
Se tu lha fosses levar!...
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Ó Morte, dava-te a vida,
Se tu lha fosses levar!...
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Com o beijo do Sol na face cadavérica,
Beijo que a morte esvai em palidez algente,
Eis a Lua a boiar sonâmbula e quimérica...
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Doce, canta uma voz melancolicamente:
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O meu amor escondi-o
Numa cova ao pé do mar...
Morre o amor, vive a saudade...
Morre o Sol, olha o luar!...
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Morre o amor, vive a saudade...
Morre o Sol, olha o luar!...
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Latescente a neblina opálica flutua,
Diluindo, evaporando os montes de granito
Em colossos de sonho, extasiados de Lua...
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Flébil, chora uma voz no letargo infinito:
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Quem dá ais, ó rouxinol,
Lá para as bandas do mar?...
É o meu amor na cova
Leva as noites a chorar!...
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É o meu amor na cova
Leva as noites a chorar!...
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A Lua enorme, a Lua argêntea, a Lua calma,
imponderalizou a natureza inteira,
Descondensou-se em fluido e embebeceu-se em alma...
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Triste expira uma voz na canção derradeira:
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Ó meu amor, dorme, dorme
Na areia fina do mar,
Que em antes da estrela d'alva
Contigo me irei deitar!...
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Que em antes da estrela d'alva
Contigo me irei deitar!...
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Guerra Junqueiro
1850-1923
19 fevereiro 2016
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