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29 setembro 2007

Eles foram meus professores...

Ano lectivo de 1953/54
Desenho Biológico
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cadeira do 1ºano do
Curso de Ciências Biológicas
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Seomara da Costa Primo
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Seomara da Costa Primo - 1985/1986

Seomara da Costa Primo distinguiu-se como professora do Ensino Liceal e do Universitário, investigadora nas áreas das Ciências Naturais e da Educação, e como activista do movimento associativo do professorado do ensino liceal.

Filha de Maria Luísa Buttuller e de Manuel da Costa Primo, nasceu em Lisboa, na freguesia do Socorro, no dia 10 de Novembro de 1895 e veio a falecer na Amadora, onde viveu cerca de meio século, no dia 2 de Abril de 1986.
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Frequentou como aluna o liceu Passos Manuel, enquanto vivia com seu pai na Rua de S. João da Praça. Nesse liceu, terminou o Curso Complementar de Ciências em 1913, entrando de seguida na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa onde concluiu o Curso de Ciências Histórico-Naturais em 1919.
No decurso do ano lectivo de 1917-18 frequentou na Faculdade de Medicina as cadeiras de Histologia e Embriologia.
Exerceu o cargo de preparadora do Instituto de Histologia e Embriologia sob a orientação do Prof. Celestino da Costa.
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Em Fevereiro de 1922 fez o Exame de Estado, com 18 valores e integrou o núcleo de professores do Liceu Almeida Garrett que mais tarde se transformou no Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho

A professora e um "fiel amigo" (1930 ?)

Seomara da Costa Primo acumulou a docência universitária com a função de professora do Liceu, no período que vai de 1921 a 1942.
Em 1942 defendeu a Tese de Doutoramento, tendo sido a primeira mulher a doutorar-se em Ciências, o que lhe valeu a divulgação do ocorrido na Imprensa quotidiana bem como o acesso à cátedra de Botânica na Faculdade de Ciências de Lisboa em 1943.

Regeu as cadeiras de Morfologia e Fisiologia Vegetais, Botânica Geral e Botânica Sistemática e, a partir de 1949, a de Desenho Biológico.



Fui aluno da Professora Seomara na cadeira de Desenho Biológico em 1954. Estava ela já com 68 anos mas perfeitamente capaz de desempenhar as suas funções. Tínhamos aulas no primeiro andar, numa sala que se sobrepunha àquela onde tínhamos aulas de Matemáticas gerais com o Doutor Peter Braumann ( * ), no início do corredor grande do edifício, no piso de entrada.
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Lembro-me da Doutora Seomara, já com muita idade,mas sempre simpática e pronta a aconselhar e a corrigir muitas vezes, as “obras-primas” que desenhávamos para que ela pudesse classificar-nos. Umas folhas de “Ficus elástica” ou de “Castanea sativa” quase sempre acompanhadas com um ou dois “ouriços”… ou ainda as belas folhas de Plátano com aquele tom castanho dourado que antecede a época da queda… Havia colegas nossas que desenhavam maravilhas com um pormenor meticuloso que a maioria de nós invejava… O único desenho de que me orgulhei, feito nas aulas da professora Seomara da Costa Primo, foi o de um tigre, feito a carvão, que mantive em casa durante anos… Agora que precisei de o rever de novo, não consegui encontrá-lo!
São da nossa colega de estágio, no Liceu Pedro Nunes, a Professora Salomé Soares Pais, que pisou os corredores daquela Faculdade de Ciências na rua da Escola Politécnica, uns anos mais tarde, as palavras com que se refere à Professora de Desenho:
Deslocava-se habitualmente junto de cada aluno que, em pé, no seu estirador, passava as aulas de Desenho Biológico, no 1º andar da Faculdade de Ciências de Lisboa, na Rua da Escola Politécnica, tentando por vezes com dificuldade, fazer ressaltar um pormenor da folha ou da flor de uma Angiospérmica ou dar expressão ao bico do mais simples dos pássaros.
Quando necessário, a Prof. Seomara pegava no lápis e, como boa desenhadora Biológica que era, rapidamente corrigia a perspectiva ou exprimia o rigor da nervação ou recorte da folha desenhada
”.
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Seomara da Costa Primo publicou um grande número de livros para o ensino liceal. Eu próprio estudei no 2ºCiclo do Curso dos Liceus por um seu Compêndio de Botânica que anos mais tarde era ainda adoptado para os meus alunos do 4º e 5º anos.

Uma aguarela de Seomara Costa Primo

O morangueiro bravo (Fragaria vesca)

Segundo Helena Antunes e Cecília Galvão, autoras de um trabalho sobre esta professora, “entre o início da década de 30 e a década de 60, publicou um apreciável número de manuais para o ensino liceal – Botânica, Zoologia e Biologia – aprovados em concursos e oficialmente adoptados que, ao longo de aproximadamente quatro décadas , acompanharam sucessivas gerações de alunos.”

Na cidade da Amadora, onde viveu os últimos 50 anos, a Comissão de Toponímia atribuí o seu nome a uma das suas ruas. Também a uma Escola Secundária da Amadora foi dado o nome de "Seomara da Costa Primo".

“Aposentou-se em 1962 e, os seus últimos anos de vida foram passados com grandes dificuldades de subsistência”…

Faleceu em 2 de Abril de 1986.

Alguma da informação que recolhi foi retirada da obra "Memórias de Professores Cientistas", ed.FCUL- 2001

( * ) Apenas um apontamento histórico:

Na ausência de Vicente Gonçalves, em Outubro de 1953, foi o professor alemão Peter Braumann quem regeu o Cadeira de Matemáticas Gerais, o que fez muito à base do Cálculo de Probabilidades e Estatística… Para meu próprio espanto, e para o espanto de muita gente que me conhecia, a primeira cadeira que fiz na Faculdade de Ciências de Lisboa foi... a Matemática!
Este professor, a quem por chalaça tratávamos por "Pedro Castanho", era um “refugiado” alemão e, também,um “crânio” em Xadrez…
Quando no início de 1940, o Dr.Alexandre Alekhine esteve em Portugal, disputou algumas “simultâneas” no Estoril e em Lisboa.
Alekhine é a referência mundial do Xadrez de todos os tempos. Em 1 de Fevereiro daquele ano, disputou na Sociedade de Geografia, perante uma assistência de mais de 600 pessoas, uma simultânea com 40 dos melhores xadrezistas nacionais.
Ao cabo de oito horas e meia de luta, o campeão encontrava-se visivelmente cansado. Os seus formidáveis recursos ainda lhe valeram em bastantes partidas, entre as quais é digna de citação a jogada pelo novel xadrezista Peter Braumann: um gambito letão que desorienta o campeão do mundo. Braumann chega a jogar com duas damas mas, apesar disso, Alekhine obtém um empate.”
In, “Recordações da primeira visita a Portugal. Dr.Alexandre Alekhine, Janeiro de 1940”



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