... a propósito do Editorial de hoje
no jornal "i", da autoria do seu director
Eduardo Oliveira e Silva
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Eduardo de Oliveira e Silva
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A história emocionou e abriu patéticos (e sobretudo patetas) noticiários de televisão até que um jornal (por sinal o i) investigou e concluiu que não batia a bota com a perdigota.
É verdade que Tordo estava em situação difícil. É verdade também que o seu filho lhe dirigiu palavras ternas e sentidas. É verdade ainda que a sua reforma é uma miséria e que tudo veio parar aos media.
Mas também é verdade que Tordo exerceu sempre uma profissão liberal (a de artista), num quadro empresarial em que descontava certamente pelos valores mínimos, e nunca se queixou de tal facto enquanto ia tendo contratos e cachets que lhe permitiam viver com qualidade, alguns dos quais obtidos por ajustes directos, como noticiosamente se demonstrou.
Também é verdade que Tordo e a mulher criaram uma ONG para ajudar uma causa de grande nobreza (a igualdade de género), através da qual o cantor (por sinal do sexo masculino) foi contratado para fazer espectáculos, o que parece, no mínimo, levantar uma questão ética.
Arrasar o governo de Passos pela diminuição de receitas e pelo desinvestimento na cultura é admissível e certamente merecido. Mas há dois pontos inaceitáveis que Tordo não pode ignorar.
Em primeiro lugar a história da reforma. Cada um deve ter uma pensão em função de um balanço entre o que descontou e vai receber. Ao contrário do que se diz por aí, não há verdadeiramente desequilíbrio. Há dinheiro de sobra para pagar as reformas acordadas a quem contribuiu efectivamente. O que não há é para pagar a quem não contribuiu, o que não significa que esse indivíduo não seja merecedor de apoio do Estado, embora tenha de se assumir que essa regalia não resulta de uma convenção. Nessa circunstância, o diferencial ou a totalidade da pensão dos não contributivos deve ser paga pelo Orçamento do Estado. Partindo dessa lógica, se Tordo recebe duzentos euros, é porque descontou em função disso, pelo que está tudo certo. Se não chega e está em carência social, deve expor a situação à Segurança Social. O facto de ser empresário e de ter empregados não o impedia de acautelar a sua situação. Lamentavelmente, até houve inúmeros casos de empresários que só iniciaram descontos para beneficiarem dos melhores dez anos dos últimos 15, utilizando as vantagens de uma lei de que usufruem por chico-espertice.
Em segundo lugar, a história sinistra da ONG. Pior a emenda que o soneto. Afinal a nobre causa permitiu até um contrato de 10 mil euros para o artista, estando para se perceber para que mais serviu.
É triste. Tordo dificilmente se endireita desta história. Qualquer que seja o ângulo de análise, fica sempre mal. Insulta o governo gratuitamente quando há muitas razões substanciais para críticas. É apanhado exactamente pela falta de transparência de processos, o que é triste para uma figura de referência. Mas há um ponto para o qual o assunto pode servir. Descobrir o que está por trás das ONG. Afinal o que é isso? São causas ou negócios? O que se passa por detrás desse biombo onde se movimentam sombras de artistas, políticos, igrejas e movimentos de toda a espécie? Ora aí está uma boa matéria para ocupar a senhora procuradora-geral da República, a quem compete defender o Estado.
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