Páginas

14 julho 2016

Deles espero agora que a devolvam...

Num poema de 
António Gedeão
 a que o autor deu o nomo de
"Poema sem esperança"


António Gedeão
-
Poema sem esperança

Toda a esperança que tive a dividi
por quantos a quiseram receber
Deles espero agora que a devolvam
com novo rosto e acrescentado juro.
A esperança era fingida, toda feita
de conscientes manhas e enganos, 
tão bem arquitectada que passava
por sincera, vivida, verdadeira.
Era uma esperança imposta, necessária
para as voltas dos dias e das noites
sem roupagens, sem véus, sem adereços
como na estatuária se apresenta.
Uma esperança sem esperança, alimentada
a soro e drogas no hospital das letras:
no escuro, ensimesmada como um feto;
na luz, extravasada como adulto.
Transferindo-me a outros me recolho
e me fico, de ouvidos apurados,
num solitário andar entre automóveis
nas poluídas ruas da cidade.
.
António Gedeão
Poemas póstumos - 1983

Sem comentários: